MINHA COLUNA NA TRIBUNA DA IMPRENSA DE 11 DE ABRIL DE 2008
"O desastroso processo de recuperação judicial da Varig inaugura novo capítulo de aberrações e inversões jurídicas e legais, mais uma vez imputando aos trabalhadores da empresa os ônus do insucesso total da aplicação da nova lei."
Paulo Murilo Calasans, advogado e mestre em Direito Constitucional
Sem perder a ternura jamais, ex-funcionários Varig e beneficiários do Aerus estarão se manifestando hoje para lembrar, no transcurso do segundo aniversário da intervenção no Fundo Aerus, a mais danosa ação (e omissão) do poder público em prejuízo direto de trabalhadores e aposentados de um dos segmentos mais sensíveis da economia - a aviação comercial.
Com essas manifestações, eles estarão oferecendo um amargo testemunho do quanto se fez de errado e de mau, o quanto de crime se praticou contra a própria nação brasileira e contra alguns dos seus institutos sociais - o da aposentadoria complementar.
Todo o processo que levou a crise da maior, mais antiga e mais completa companhia aérea brasileira, com sua perversa repercussão sobre todos os que a serviram, é algo que não tem explicação e que ficará como uma mancha sangrenta na história do Brasil de nossos dias.
Não exagero nem um tiquinho em dizer que a octogenária Viação Aérea Rio-Grandense estava até bem pouco para a nossa aviação comercial tal como a Petrobras está para o Brasil. Ela não era uma empresa privada no termo clássico do catálogo da economia, mas uma verdadeira instituição, que reunia num só kit todos os equipamentos e exemplos indispensáveis a um país de dimensões continentais como o Brasil.
Tanto que, depois daquele melancólico leilão do dia de Santos Dumont, os nossos transportes aéreos já não são os mesmos. Patinam entre soluções efêmeras à espera de um golpe fatal, que só não ocorreu porque as estrangeiras, estas sim, vivem seus próprios infortúnios e estão sem asas para apoderar-se dos nossos céus de anil.
Crime imperdoável
Mais emblemático foi o fundo de pensão dos trabalhadores na aviação, o Aerus, nascido em 1977 como compensação pelo golpe da Previdência Pública de então, que deixava de assegurar aos aeronautas a remuneração garantida nos tempos do antigo Iapfesp.
O Aerus, para os que não sabem, não surgiu como um mero fundo de complementação de aposentadorias de pensões. Quase pioneiro, ele passou a ser uma "resposta atuarial" bem calculada para garantir o amanhã dos profissionais de uma carreira que opera em condições especiais, responsáveis por doenças profissionais e limitações reconhecidas no mundo inteiro.
A Varig tinha um modelo de gestão que jamais poderia escapar à vigilância do poder público. Ele serviu de um verdadeiro amálgama de uma grande família profissional altamente apaixonada pelo que fazia e altamente consciente de sua responsabilidade social, isso naqueles anos em que não se falava nessa obrigação tão propagada nos dias de hoje.
Mas, por conta de omissões e de prevaricações, a gestão sob o comando de uma fundação de empregados ficou no meio do caminho. Acabou que um determinado grupo dava as cartas e a Varig, preferida por 9 em cada 10 viajantes brasileiros, não teve o estofo necessário para fazer frente às crises do setor e às suas próprias pendências.
Sua deterioração, porém, não aconteceu ao silêncio de seus profissionais. Desde as primeiras turbulências, no começo deste século, as associações profissionais da Varig vinham apontando o desastre futuro e apresentando alternativas para evitar que o pior viesse a acontecer, o que infelizmente não foi possível evitar, sobretudo porque os sucessivos governos, principalmente o do sr. Luiz Inácio, pareciam altamente comprometidos com o desfecho que, como não podia deixar de ser, abriu céus e terras para emergentes mais habituados a ônibus voadores.
Cumplicidade geral
Para favorecer o destrambelhamento da Varig e do Aerus, o Poder Executivo não ficou sozinho. Teve a seu lado, como parte do mesmo complô, um Poder Legislativo de omissos e até um juiz empresarial de conduta desastrada. Esse juiz criou mil óbices para o inteligente projeto criado pelo TGV - Trabalhadores do Grupo Varig - e confiou de olhos fechados num fundo estrangeiro abutre, cuja maior proeminência, o chinês Lap Wai Chan, está neste momento impedido de sair do país, depois de aprontar poucas e boas, como estava desenhado em sua testa e nos ensaios sujos que só não via quem não queria.
Acompanhei toda essa irresponsabilidade que culminou com a transformação da Varig numa peça de ficção em relação ao que ela já foi e AINDA PODE SER e não entendo como até hoje, depois de pagar tantos micos em nossos aeroportos, esse governo que se pretende o melhor da história ainda não teve a lisura exigida para reconhecer que pisou na bola aos olhos de todos e que tem o caminho fácil para reabilitar-se, caminho que fica cada vez mais estreito e mais ínvio à medida que o tempo passa.
É isso mesmo. O processo aberto pela Varig para compensar os prejuízos com a defasagem tarifária já vai fazer maioridade e até hoje a nossa Justiça continua manietada pela sucessão de recursos do governo contra as decisões já adotadas, em diversas instâncias, sempre no reconhecimento da dívida com a empresa.
Essa grana, que hoje passa dos seis bilhões de reais, daria para resolver todos os problemas da Varig, principalmente a dívida de mais de 3 bilhões com o fundo de pensão. Hoje, apesar das gestões do ministro Carlos Lupi, do Trabalho, os representantes do Executivo continuam agindo para que a matéria não seja finalmente julgada, com o que isso representa de trágico para a sorte de milhares de profissionais, sacudidos de quando em vez por verdadeiros rebates falsos, como essa história das debêntures resgatadas pela Gol no dia 21 de dezembro passado.
Até hoje - segundo depoimento do comissário aposentado José Paulo Resende, em carta a um senador -, a primeira delas não foi depositada nos cofres do Aerus (debênture para a Classe 2 de Credores - Aerus) e a outra debênture da Classe 1 de Credores (para pagamento de dívidas trabalhistas) está sob julgamento. "Sobre esta debênture da Classe 1 de Credores tenho a informar a V. Excia. que só serão pagos 20% (somente 20%, que fique bem claro) da dívida trabalhista com estes trabalhadores da ativa da Varig quando a Justiça decidir sobre pendências que existem sobre esta debênture para a Classe 1".
Poucas histórias de um grupo profissional tiveram tinturas tão sujas como essa que envolve a Varig e o Aerus, razão porque esse governo só pode olhar para alguém olho no olho no dia em que fizer o que evita fazer até hoje, sabe Deus por quê.
mailto:coluna@pedroporfirio.com
Sem perder a ternura jamais, ex-funcionários Varig e beneficiários do Aerus estarão se manifestando hoje para lembrar, no transcurso do segundo aniversário da intervenção no Fundo Aerus, a mais danosa ação (e omissão) do poder público em prejuízo direto de trabalhadores e aposentados de um dos segmentos mais sensíveis da economia - a aviação comercial.
Com essas manifestações, eles estarão oferecendo um amargo testemunho do quanto se fez de errado e de mau, o quanto de crime se praticou contra a própria nação brasileira e contra alguns dos seus institutos sociais - o da aposentadoria complementar.
Todo o processo que levou a crise da maior, mais antiga e mais completa companhia aérea brasileira, com sua perversa repercussão sobre todos os que a serviram, é algo que não tem explicação e que ficará como uma mancha sangrenta na história do Brasil de nossos dias.
Não exagero nem um tiquinho em dizer que a octogenária Viação Aérea Rio-Grandense estava até bem pouco para a nossa aviação comercial tal como a Petrobras está para o Brasil. Ela não era uma empresa privada no termo clássico do catálogo da economia, mas uma verdadeira instituição, que reunia num só kit todos os equipamentos e exemplos indispensáveis a um país de dimensões continentais como o Brasil.
Tanto que, depois daquele melancólico leilão do dia de Santos Dumont, os nossos transportes aéreos já não são os mesmos. Patinam entre soluções efêmeras à espera de um golpe fatal, que só não ocorreu porque as estrangeiras, estas sim, vivem seus próprios infortúnios e estão sem asas para apoderar-se dos nossos céus de anil.
Crime imperdoável
Mais emblemático foi o fundo de pensão dos trabalhadores na aviação, o Aerus, nascido em 1977 como compensação pelo golpe da Previdência Pública de então, que deixava de assegurar aos aeronautas a remuneração garantida nos tempos do antigo Iapfesp.
O Aerus, para os que não sabem, não surgiu como um mero fundo de complementação de aposentadorias de pensões. Quase pioneiro, ele passou a ser uma "resposta atuarial" bem calculada para garantir o amanhã dos profissionais de uma carreira que opera em condições especiais, responsáveis por doenças profissionais e limitações reconhecidas no mundo inteiro.
A Varig tinha um modelo de gestão que jamais poderia escapar à vigilância do poder público. Ele serviu de um verdadeiro amálgama de uma grande família profissional altamente apaixonada pelo que fazia e altamente consciente de sua responsabilidade social, isso naqueles anos em que não se falava nessa obrigação tão propagada nos dias de hoje.
Mas, por conta de omissões e de prevaricações, a gestão sob o comando de uma fundação de empregados ficou no meio do caminho. Acabou que um determinado grupo dava as cartas e a Varig, preferida por 9 em cada 10 viajantes brasileiros, não teve o estofo necessário para fazer frente às crises do setor e às suas próprias pendências.
Sua deterioração, porém, não aconteceu ao silêncio de seus profissionais. Desde as primeiras turbulências, no começo deste século, as associações profissionais da Varig vinham apontando o desastre futuro e apresentando alternativas para evitar que o pior viesse a acontecer, o que infelizmente não foi possível evitar, sobretudo porque os sucessivos governos, principalmente o do sr. Luiz Inácio, pareciam altamente comprometidos com o desfecho que, como não podia deixar de ser, abriu céus e terras para emergentes mais habituados a ônibus voadores.
Cumplicidade geral
Para favorecer o destrambelhamento da Varig e do Aerus, o Poder Executivo não ficou sozinho. Teve a seu lado, como parte do mesmo complô, um Poder Legislativo de omissos e até um juiz empresarial de conduta desastrada. Esse juiz criou mil óbices para o inteligente projeto criado pelo TGV - Trabalhadores do Grupo Varig - e confiou de olhos fechados num fundo estrangeiro abutre, cuja maior proeminência, o chinês Lap Wai Chan, está neste momento impedido de sair do país, depois de aprontar poucas e boas, como estava desenhado em sua testa e nos ensaios sujos que só não via quem não queria.
Acompanhei toda essa irresponsabilidade que culminou com a transformação da Varig numa peça de ficção em relação ao que ela já foi e AINDA PODE SER e não entendo como até hoje, depois de pagar tantos micos em nossos aeroportos, esse governo que se pretende o melhor da história ainda não teve a lisura exigida para reconhecer que pisou na bola aos olhos de todos e que tem o caminho fácil para reabilitar-se, caminho que fica cada vez mais estreito e mais ínvio à medida que o tempo passa.
É isso mesmo. O processo aberto pela Varig para compensar os prejuízos com a defasagem tarifária já vai fazer maioridade e até hoje a nossa Justiça continua manietada pela sucessão de recursos do governo contra as decisões já adotadas, em diversas instâncias, sempre no reconhecimento da dívida com a empresa.
Essa grana, que hoje passa dos seis bilhões de reais, daria para resolver todos os problemas da Varig, principalmente a dívida de mais de 3 bilhões com o fundo de pensão. Hoje, apesar das gestões do ministro Carlos Lupi, do Trabalho, os representantes do Executivo continuam agindo para que a matéria não seja finalmente julgada, com o que isso representa de trágico para a sorte de milhares de profissionais, sacudidos de quando em vez por verdadeiros rebates falsos, como essa história das debêntures resgatadas pela Gol no dia 21 de dezembro passado.
Até hoje - segundo depoimento do comissário aposentado José Paulo Resende, em carta a um senador -, a primeira delas não foi depositada nos cofres do Aerus (debênture para a Classe 2 de Credores - Aerus) e a outra debênture da Classe 1 de Credores (para pagamento de dívidas trabalhistas) está sob julgamento. "Sobre esta debênture da Classe 1 de Credores tenho a informar a V. Excia. que só serão pagos 20% (somente 20%, que fique bem claro) da dívida trabalhista com estes trabalhadores da ativa da Varig quando a Justiça decidir sobre pendências que existem sobre esta debênture para a Classe 1".
Poucas histórias de um grupo profissional tiveram tinturas tão sujas como essa que envolve a Varig e o Aerus, razão porque esse governo só pode olhar para alguém olho no olho no dia em que fizer o que evita fazer até hoje, sabe Deus por quê.
mailto:coluna@pedroporfirio.com
4 comentários:
É muito bonito falar de Varig, de esperança, de governo ruim.
Mas a história não foi tão romântica e varig ganho na Justiça o que não deveria ganhar.
Ganhou por omissão, como ganhou Transbrasil.
O governo atual possui todo o direito de postergar um pagamento que não acredita justo.
Acordos foram propostos, o BNDS quis acudir, o tal Fundo não quis.
E o tal Fundo aplicou na Varig, aceitou seu risco.
Eu não quero pagar nada, o dinheiro do governo é meu também.
Faliu, pede ao governo??
Isso é bom para políticos!
Não consigo entender como alguém pode achar justo o que o governo faz e fez com a Varig.
Esse alguém a que me refiro é o postante Anônimo que escreveu aí em cima.
Quando ele estiver numa situação semelhante, quererá que o governo o ajude.
Aliás, anonimato é vedado pela Constituição, cidadão. Você não o sabia?
Acho que esconder-se atrás de um "Anônimo" é uma tremenda covardia.
O governo tem a obrigação, sim, de ajudar a Varig. O BNDES deu dinheiro para o Banestado e para tantas outras estatais "privatizadas", por que não dar a Varig?
Acho que está na hora de você, Anônimo, rever seus conceitos.
Não sou especialista em economia, nem entendo os pormenores técnicos do sufocamento de uma empresa brasileira. Fica, entretanto, uma questão genérica: Por que os ditos países desenvolvidos protegem, subsidiam e socorrem suas empresas e nós agimos no sentido contrário, facilitando a "doação" do patrimônio nacional, um verdadeiro crime de lesa-pátria?
Pelo simples fato de se manter anonimo, não merece consideração.
Não sabe nada a respeito dos desmandos do governo e suas ações em prejuizo da Varig.
Não sabe que tudo foi feito a revelia dos seus funcionários e tripulantes, que desbravaram esse País e não fazem e nunca fizeram parte da Fundação.
Fique com a boca fechada e não fale besteiras.
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