quinta-feira, 24 de abril de 2008

Um castigo para quem não está com o pé na cova


Na inauguração da agência do INSS em Hortolândia, no interior de São Paulo, em dezembro de 2007, o ministro Luiz Marinho, da Previdência, fez um pronunciamento pra lá de infeliz diante de uma manifestação de protesto de aposentados: "Estamos num País democrático, onde as pessoas se dão o direito até ao ridículo", afirmou. É este ex-presidente da CUT, que não entende patavinas de previdência, que pretende barrar o projeto do senador Paulo Paim, do seu partido, acabando com o ardiloso "fator previdenciário", que reduz a aposentadoria por um cálculo de araque, que inclui até a expectativa de vida do beneficiado. Além de despreparado, Marinho se revelou arrogante diante da tragédia dos aposentados, que são castigados para que a Previdência Pública abra espaço para a privada, como aconteceu com os planos de saúde.

MINHA COLUNA NA TRIBUNA CDA IMPRENSA DE 25 DE ABRIL DE 2008
“Os operadores políticos de Lula foram orientados a repassar ao consórcio partidário que dá suporte ao governo na Câmara uma determinação constrangedora. Em pleno ano eleitoral, o presidente encomendou aos deputados a derrubada de um projeto que beneficia algo como 25 milhões de aposentados e pensionistas da Previdência”
Rodrigo Pavan, FOLHA DE SÃO PAULO
Até hoje, milhares de brasileiros, como eu, estão com o massacre dos beneficiários do Aerus atravessado na garganta. O que se fez com esses antigos ases de nossa aviação comercial não seria admissível nem num governo petrificado por idiossincrasias que consideram populismo qualquer preocupação de natureza social.
Mas originando-se de um governo do Partido dos Trabalhadores, que se fez na esteira de um sonho e de muitas esperanças, esse desfecho da crise da Varig, com suas seqüelas de feridas expostas, atingindo a própria dignidade dos aposentados e pensionistas que viram seu fundo de pensão desmilingüir-se enquanto a União protela o pagamento de uma dívida que resolveria todos os problemas, a agressão histórica é muito mais desastrosa.
Vale a pena relembrar essa novela, para que você entenda a truculenta reação do presidente Lula e do seu ministro da Previdência, um ex-presidente da CUT, diante de uma proposta reparadora, iniciativa de um parlamentar sério, por acaso nascido e criado na mesma estufa petista.
Com o criminoso desmonte da Varig, cujas conseqüências para a aviação comercial brasileira já se fazem sentir de forma dramática, foi junto o fundo de pensão complementar, para o qual milhares de aeronautas e aeroviários contribuíram enquanto trabalhavam.
Esse fundo, criado para toda a aviação comercial, era credor de mais de R$ 3 bilhões de reais da empresa, que parara de recolher suas contribuições há muitos anos, ante a omissão da Secretaria de Previdência Privada do MPAS.
Ao mesmo tempo, a companhia ganhou em todas as instâncias sua reclamação para repor as perdas causadas por políticas tarifárias governamentais. Falo de um processo que já vai chegar ao seu 18º ano. Pelas contas mais generosas, o governo deve a empresa que veio a desmoronar mais de R$ 6 bilhões de reais.
Ao invés de buscar uma solução, beneficiando a todos, a postura do governo Lula foi a de que não tinha nada a ver com o peixe. Resultado: hoje, não apenas os trabalhadores que foram para o olho da rua sem suas verbas rescisórias estão a ver navios (eles que trabalhavam em aviões). Principalmente os aposentados e pensionistas tiveram uma redução drástica de seus orçamentos.
Cálculo de araque
Em função dessa história não me surpreende que o sr. Luiz Inácio tenha anunciado que fará das tripas coração para derrubar na Câmara Federal os projetos do senador Paulo Paim, do seu partido, já aprovados no Senado, que libertam os aposentados do ardiloso e inconstitucional “fator previdenciário” e garantem a todos os mesmos índices conferidos aos que recebem o mínimo.
Se não estivessem no governo à custa da mistificação de políticas compensatórias e da incompetência de uma oposição carcomida, Lula e sua trupe fariam outro discurso. Ao invés dessa falácia de que a previdência pública é deficitária (que, aliás, o próprio chegou a contestar num raro momento de lucidez), assumiriam a responsabilidade de encontrar os meios para promover justiça e evitar que a vida de um aposentado ou uma pensionista seja um castigo, como acontece hoje em dia.
O “fator previdenciário” é um cálculo de araque inventado pela equipe de FHC e já inspirado numa tentativa de Collor, o primeiro a bancar a miniaturização do Estado brasileiro. Esse fator produz uma matemática que é mais perversa do que o limite de dez salários mínimos para a aposentadoria, limite imposto, aliás, no regime de arbítrio. Antes da unificação dos institutos de aposentadoria e pensões, no início da década de setenta, o teto da aposentadoria era de 20 salários mínimos.
O fator previdenciário desrespeita o tempo de contribuição ainda vigente para efeito de cálculo da aposentadoria, na medida em que introduz outros redutores, como a idade e – pasmem - a expectativa de sobrevida do segurado.
Assim, se você contribui para um determinado retorno, fatalmente terá esse benefício recalculado e sairá perdendo, principalmente se não estiver com o pé na cova.
A outra excrescência é o diferencial nos aumentos. Enquanto concede ao mínimo um percentual na direção da recuperação de perdas históricas, o governo limita os reajustes dos demais aposentados e pensionistas. Daqui a alguns anos, nesse diapasão, todos receberão o mínimo, independente do que ganhavam e do que contribuíram quando estavam trabalhando.
Medo de fantasmas
O senador Paulo Paim não é nenhum irresponsável. Ao contrário, sempre dedicou seus mandatos ao estudo das relações de trabalho, sendo de longe o melhor quadro do PT nessa especialidade.
Ele não iria apresentar um projeto de tal alcance se não tivesse feito os cálculos devidos, até porque o que ninguém pode dizer é que ele tenha intenção de criar embaraços para o governo do partido em que sempre deu o melhor de si.
Todo mundo sabe que o sr. Luiz Marinho, ao contrário, não entende bulufas de Previdência. Foi para esse ministério por acaso e até meio a contragosto. Estava politicando no Ministério do Trabalho quando os petistas do ramo previdenciário e o lobby do ramo vetaram a indicação do pedetista Carlos Lupi, que poderia ser um obstáculo à prometida “terceira reforma da previdência”. Nos acréscimos, Lula remanejou Marinho para a Previdência e pôs o presidente do PDT no seu lugar.
Como Lula também não entende do “economês” dos interesses que manipulam a Previdência e como ele vive assustado com medo de alguns fantasmas, não é difícil para os que precisam caricaturar a previdência pública jogar o presidente e o ministro contra o resgate de direitos. Basta manter repetir a falácia do déficit previdenciário com os cálculos que eles não saberão conferir.
Lula, aliás, como em outras questões de que já tratei, morre de medo de sair fora da cartilha neoliberal. Neste caso, porém, se ele recorrer aos expedientes de poder já conhecidos, estará desbotando ainda mais a estrela do seu partido, que é também o mesmo do senador Paulo Paim.
coluna@pedroporfirio.com
LEIA MAIS EM PORFÍRIO URGENTE
Lula desautoriza base a aprovar fim do fator previdenciário

Um comentário:

Anônimo disse...

É lamentável a situação dos aposentados e pensionistas deste país. Um presidente que não tem amor ao próximo, e o pior, não respeita os idosos que já trabalharam muito para ter um Brasil melhor. Meu pai aposentou com seis salários, e hoje só recebe um. Foi caminhoneiro por 48 anos levando café para o Brasil inteiro. E eu como pensionista do AERUS/VARIG passando dificuldades por causa de terceiros.
Hoje tenho vergonha do meu país que está infestado por corruptos.