sexta-feira, 30 de maio de 2008

Uma pergunta inesperada. O que você responderia?


O ÚLTIMO REVEILLON
Brizola costumava convidar a família e alguns amigos para passar o reveillon em seu apartamento, na Avenida Atlâ ntica. Mas na entrada de 2004, ao lado dos netos, bisnetos e do filho João Otávio, fui o único correligionário com mandato que ele chamou para o que seria o seu último reveillon. Foi uma noite inesquescível, porque conversarmos num momento em que o grande patriota já não tinha tantos amigos assim.
“Todas as crianças deveriam ter direito à escola, mas para aprender devem estar bem nutridas. Sem a preparação do ser humano, não há desenvolvimento. A violência é fruto da falta de educação”.
Leonel Brizola (1922-2004)
Já eram quase duas horas da tarde quando ia saindo do movimentado restaurante de saladas da Senador Dantas, ao lado do falecido Cine Vitória, quando fui abordado, ainda entre suas mesas, por um quarentão de bochechas salientes e uma boina que parecia servir só para esconder a careca:
- Porfírio, posso lhe fazer uma pergunta?
Assim de chofre aquela interpelação me deixou curioso. Péssimo fisionomista, de perder amigos e votos por não reconhecer pessoas, tinha a convicção de nunca ter visto aquela figura em toda a minha vida.
Mas ele, que almoçava um prato cheio de costas para a porta, já quase no fundo do restaurante que servia refeições a quilo, dirigira-se a mim com aquela intimidade de quem, no mínimo teria freqüentado a mesma arquibancada do Maracanã.
Hipótese que, se passou pela minha cabeça, logo descartei: há muito prefiro jogar minha pelada com os filhos e seus parceiros do que ir ao grande palco do futebol. Também pudera: o meu Bangu já não vê seu gramado a lustros.
Como não podia deixar de ser, por primária educação e elevado espírito público, postei-me, em pé, à espera da interrogação. Ele devia ser um grandalhão, porque, sentado, ficava ao meu nível, o que, aliás, não é nenhuma vantagem. Qualquer brasileiro é maior do que eu, como era do Getúlio, do Prestes e do nosso contemporâneo Jefferson Perez.
Olhando-me como alguém que tem algo guardado a sete chaves para jogar-me na cara, diante da minha manifesta disposição de ouvi-lo, ele deu uma mastigada e, finalmente, fez a pergunta, que parecia sair do fundo do coração:
- Você tem saudades do Brizola?
Confesso que esperava tudo, menos aquela inesperadíssima manifestação. E de tal sorte foi a surpresa que um mundo de dúvidas avançou sobre meu cérebro pronto para tudo, menos para oferecer uma resposta tranqüila.
Por que aquele cidadão me pararia só para perguntar algo que, certamente, até por uma questão de lógica, teria uma resposta na ponta da língua?
Mais uma vez peregrinei errante pelas sendas da memória. Tinha obrigação de identificar aquela figura insólita, a primeira a me surpreender com uma dúvida que caiu como uma cobrança, como se eu, além de tudo compadre do grande patriota, tivesse olvidado a torrente de ensinamentos que ele nos deixou ao longo dos seus 82 anos vividos intensamente.
Mas quanto mais cavucava, mais o cérebro negava fogo. Pensei: talvez, se o cidadão estivesse em pé, mostrando-se por inteiro, eu alcançaria algum sinal de um encontro fortuito, em algum lugar da minha vida atribulada.
Deu branco mesmo. Já devia ter decorrido mais de dez segundos, enquanto ele me olhava como se fosse um representante da história do Brasil, o semblante paralisado, como quem dissesse a si mesmo: peguei esse cara, já sei o que ele vai responder, mas quero saber de que palavras se servirá.
Fiz o que não costumo: respirei fundo. Contemplei outras tantas pessoas, que se sentavam solitárias nas mesmas mesas e não trocavam uma palavra. Tratavam, tão somente, de matar a fome no menor espaço de tempo, como se almoçar fosse uma compulsória obrigação fisiológica.
Depois de passar em revista aquela comunidade de ocasião, contemplando alguns rostos que pareciam espelhar preocupações, decidi finalmente pela resposta, se possível, a mais inteira possível:
- Qual o brasileiro que não sente saudade do Brizola?
Ele não gostou. Primeiro, porque não queria saber dos 180 milhões de compatriotas, mas de mim, com toda a sinceridade d`alma. Segundo, porque, como deixaria no ar, todos, sem exceção, só têm saudades do velho caudilho da boca para fora. Eu, inclusive.
Naquele momento, só me passava pela cabeça a idéia de me desvencilhar do curioso comensal. Ele continuava enchendo a boca com porções fartas de feijão e arroz, uma ameaça de, mesmo involuntariamente, espargir sobre minha camisa branca alguns grãos já recheados por suas salivas.
E eu tinha hora no minúsculo escritório da Senador Dantas para saber se já haviam decifrado a decisão do Órgão Especial que, por 13 a 4, extinguiu o mandado de segurança que, por liminar, pôs outro no meu lugar na Câmara Municipal do Rio de Janeiro.
Decifrar, sim. Porque embora o usurpador estivesse no exercício de meu mandato por conta da liminar que caíra, minha advogada, da competentíssima equipe do professor Siqueira Castro, preferia esperar o acórdão, já que o mote da decisão teria sido a perda de objeto, como consta da informação no site do Tribunal de Justiça.
Mas o homem, de faca e garfo nas mãos, queria ouvir mais. Talvez um novo panegírico até mesmo uma palavra renegada, porque ele mesmo nada expunha e, afinal, de alguém que você nunca viu mais gordo pode esperar as mais diversas atitudes.
Mas eu tinha minhas obrigações com a hora. Se há uma coisa que me tortura é chegar atrasado a um compromisso. Incrustou-se em minha personalidade um fato ocorrido quando eu, já jornalista, aos 18 anos, fui a uma reunião com colegas de outros países, na Rádio Havana, em Cuba. Um francês chegou depois da hora e pediu desculpas pelo atraso de cinco minutos.
- Cinco, não, cinqüenta – observou o colega alemão. Se somos dez, subtraiu cinco minutos da vida de cada um, portanto, nos atrasou cinqüenta minutos.
Não ia contar essa história para o homem que não parava de mastigar, enquanto lançava seu olhar fulminante sobre mim. Não vou dizer que ele me segurou pelo braço, que isso não aconteceu. Mas eu próprio me sentia acorrentado ao homem interessado em saber se eu sentia saudades do Brizola.
Foi então que me veio à cabeça a coincidência. Agora em junho, para ser exato no dia 21, transcorrerá o quarto aniversário da morte daquele que dedicou todos os 37 milhões e 800 mil minutos de sua vida à missão de transformar para melhor a vida dos brasileiros, especialmente os pobres como foi ele em sua infância de engraxate e ascensorista.
E com essa lembrança, sobreveio-me a convicção de que aquela pergunta, na hora do almoço, feita por um homem que continuo sem saber quem é, até porque não me ocorreu sequer perguntar-lhe o nome, tinha muita razão de ser.
Será que os brasileiros têm uma idéia de quem realmente foi Leonel de Moura Brizola? Será que estamos à altura de seu exemplo, assim como os muçulmanos sunitas tanta importância dão aos 22 anos de pregação do seu profeta?
coluna@pedroporfirio.com

quinta-feira, 29 de maio de 2008

Sabor amargo depois do almoço



Deputado Paulo Ramos, assistente social Regina Maciel, Pedro Porfírio, Consuelo Maria, Bognesse, o incansável Paulo Resende, o grande comunicador do grupo de gtrabalhadores da Varig e aposentados do Aerus. Ao alto, um grupo de varignniaans, entre os quais Lúcia Lopes e Maria João.


Descontração e dignidade. No dia dos comissários, um encontro com profissionais que fizeram história e elevaram o nome do nosso país nos ceus do Brasil e dos quatro continentes. É uma pena que só o governo não saiba o crime que cometeu contra a aviação comercial brasileira ao abandonar a Varig e o Aerus à própria sorte.

Todo dia 31 de maio, em todo o mundo, os milhões de passageiros devem uma flor a uma das mais encantadoras atividades profissionais: o comissário de bordo.
E quando se fala nessa carreira, vem logo à mente a figura doce de aeromoças sempre atentas e prestativas, com um sorriso nos lábios e um mundo de história por contar.
No Brasil, essa homenagem é lembrada com almoços dos profissionais de hoje e de ontem. O mais tradicional, como não poderia deixar é o do pessoal da octogenária Viação Aérea Rio Grande – a nossa querida Varig.
Um almoço dessa natureza, nos dias de hoje, no entanto, tem um sabor diferente. O sabor amargo da incúria, da injustiça, da arrogância e do desrespeito.
Isso eu vi em cada semblante daqueles que se reencontraram com a dignidade que jamais lhes faltará no evento da Galeria Gourmet. Dia 28. Ali estava parte de uma história construída com muito amor, vocação, competência e responsabilidade.
Uma história que, para a infelicidade geral do Brasil, foi bruscamente interrompida com todos os requintes de traição e perversidade.
Porque não tem explicação, não tem lógica e, ainda por cima, atingiu milhares de brasileiros indefesos pela aposentadoria complementar de um fundo privado mal parado, surrupiada na maior, como uma tortura anunciada, no que ecoou como o mais indigno castigo a quem tanto serviços prestou a todos nós, ao longo de tantas décadas.
Ter ido aquele encontro, como já fizera no ano passado, me permitiu lavar a alma, por ver que aquelas pessoas traídas por quem cresceu empunhando a bandeira dos trabalhadores; aquelas pessoas sorriam, no entanto, pelo singelo prazer de rever colegas, entre os quais estava lá, amparada pelas muletas, a assistente social que foi durante 29 anos uma espécie de anjo da guarda dos profissionais da mais preparada corporação aérea do mundo.
Ao sair, ao despedir-me daquelas pessoas que permanecem vivas apesar das tentativas de holocausto, que sublimavam no seu dia a grande frustração do trágico desfecho de uma capítulo sujo da história da aviação comercial brasileira, uma sensação de revolta se apossou da minha alma.
Será que a história da civilização tem de passar por cortes tão brutais nas vidas das pessoas que jamais vacilaram no convívio com esse misterioso mundo das nuvens?
Será que não vai aparecer alguém de bom senso, de responsabilidade, para assumir a correção de um erro histórico, resgatando com todas as peças a empresa que um dia foi mais importante em muitas cidades do mundo do que nossa própria Embaixada?
Meu Deus! Como tudo isso me detona a própria fé nos poderes públicos, nos políticos, juizes e senhores da grande mídia. Como eu gostaria de ser mais jovem para fazer alguns pilantras amargarem o mesmo que aquela gente decente amarga desde que a Varig foi entregue de mão beijada a um aventureiro chinês e o fundo Aerus desmoronou. Como! Como!
coluna@pedroporfirio.com

domingo, 25 de maio de 2008

Para os que não sacaram que a fila andou

Vladimir Palmeira no site do Zé Dirceu: "Os que chegaram, pouco a pouco, adquiriram uma visão crítica de Cuba, e viram que no Brasil o movimento se encaminhava para o desastre. Nós tiramos uma resolução lá de mandar um quadro político para o Brasil, para salvar a vida das pessoas porque nós [do movimento] seríamos destruídos. Eu disse: “vamos morrer todos. Nós somos quadros estratégicos, quadros políticos e no Brasil não tem mais isso”. Os que aqui ficaram foram presos, caíram um atrás do outro".

MINHA COLUNA NA TRIBUNA DA IMPRENSA DE 26 DE MAIO DE 2008

“Eu acredito que a opção pela luta armada foi um erro. Eu já achava naquela época. Enquanto estive solto, o meu grupo político não fez ação armada”.
Vladimir Palmeira, em entrevista ao site do Zé Dirceu em 28.3.2008

Sabia que minhas náuseas diante do patrulhamento nostálgico dos órfãos da ditadura provocariam reações epidérmicas de gregos e troianos. Pelo que sinto, o que escrevo, aliás, pode ser catalogado como carga pesada, ou, como virou lugar comum dizer, nitroglicerina pura.
Mas compensa seguir a trilha da pirambeira. Entre um espasmo e outro, deu gosto receber alguns depoimentos de contemporâneos daqueles dias que se incluem entre os 99% dos militares que nada tinham com os porões da ditadura, até porque, como já contei um dia, também a eles era vedado o acesso aos açougues da tortura.
Mais do que polemizar com alguns que ainda tentam desesperadamente anistiar os choques elétricos, as sevícias nos “paus-de-arara” e os assassinatos covardes com requintes da mais insana perversidade, como aconteceu com o jovem Stuart Angel Jones, cabe ir fundo na avaliação da esterilização política promovida pela ditadura.
Toda essa amarga constatação de um cenário político dominado por um submundo de corruptos e ladrões tem raiz no processo traumático que silenciou as mais lídimas utopias juvenis e empurrou a moçada de ontem e de hoje para o impropério das refinadas arapucas.
Bicho de sete cabeças, o sistema, que levou os militares ao golpe e depois deles se descartou como bagaços de laranja, não brinca em serviço. É regado por um orçamento anual superior a meio trilhão de dólares, dinheiro que não acaba mais. Isso falando só do que é arrancado do contribuinte norte-americano.
Pragmático, optou por novos personagens e figurinos mais alegres. Trocou o choque elétrico pelo choque da eletrônica, o rosto carrancudo dos endemoninhados pelo sorriso cínico dos endiabrados.
Esse sistema é capaz de operar com precisão milimétrica as atitudes de boa parte dos líderes e formadores de opinião, além de ludibriar a população, recorrendo a técnicas que vão desde a exacerbação dos ressentimentos, à imobilização das massas famélicas com migalhas compensatórias, à sustentação dos antigos fantasmas encarnados, até o suborno puro e simples de quem um dia já pensou com o próprio cérebro ou pode vir a pensar amanhã.
Mudança de fachada
Não seria exagero afirmar que a pós-ditadura como aconteceu no Brasil é apenas uma variável do mesmo projeto colonial. Porque persistem suas eminências e seus cordéis. E isso se faz às escâncaras, sem escrúpulos e sem constrangimento. A personificação desse elo está na figura do homem que foi o tzar da economia à sombra dos generais da intolerância.
O mesmo é de fato neste lustro o verdadeiro ministro da Fazenda do ex-sindicalista, embora não ocupe um único cargo formal, tal como aconteceu no tucanato com o diplomata banqueiro, que é o mais imponente exemplar do servidor ambivalente.
Eu diria que o sistema está hoje totalmente por cima da carne seca entre nós, como esteve na era do “prende e arrebenta”. A diferença é de roupagem. De onde a ralé continua procurando chifre em cabeça de burro, enquanto a caravana chique desfila de caras novas, de costas para os idos da insurgência e de olho para os vindos do bem bom.
A catilinária de hoje têm origem no ciúme doentio porque a fila andou. Serviçais dos poderosos são fartos no mercado dos falsos brilhantes. Não é difícil a reposição. Mais bem cotados agora são os que ostentam semblantes maquiados, pronunciam discursos eloqüentes e encenam bravatas voláteis.
Outros não. São cães raivosos que ainda não descobriram a inversão dos papéis ou não aceitam serem trocados por antigos “infantes terribles”. Falta-lhes o “talento” do fidalgo José Ribamar de Araújo Costa, codinome Sarney, que teve as bênçãos do Dr. Jango, virou-lhe as costas para servir com unhas e dentes ao regime do arbítrio e no, acender das luzes, tornou ao lar doutrora, ganhando de lambuja um mandato presidencial jamais esperado e uma cadeira no Senado por um Estado que mal conhecia.
Chego a ter dó dos nostálgicos que vituperam contra os arlequins que viraram a casaca e ganharam prêmios, como é dos hábitos milenares. A insurgência agora só entra no rodapé da ficha para revestir de sabor cremoso a prestação de serviços aos donos do mundo - os agiotas de fino trato e os fabricantes de armas e de guerras.
Como são míopes incuráveis, os patrulheiros do passado vão ficar aí chovendo no molhado, porque ainda não viram a banda passar. Pior: nem perceberam que já foram solenemente descartados pelo império que, aliás, em queda livre, vai sofrer sua própria catarse pelas mãos do mulato afrodisíaco.
Jovens sem rumo
Queriam ver a juventude fora de combate e conseguiram. Agora, já não está na agenda o confronto utópico, a busca do mundo melhor que a má fé sataniza como projeto de uma ditadura vermelha (escondem a odisséia sandinista, revolucionária e democrática, que os desmascara), mas acabaram tendo de conviver com o verde da maconha e os embalos lisérgicos de sábado à noite.
Os recalcitrantes da paranóia anticomunista estão lendo os alfarrábios das traças, enquanto noviços rebeldes d`antão já viraram a página. Quer saber? Dá uma olhada na entrevista do Vladimir Palmeira ao Zé Dirceu, em março passado. Basta clicar aqui.
Eu ainda prefiro a pureza da rebeldia à maturidade da conveniência. Prefiro a menina Dilma dizendo “Não”, do que a coroa Rousseff dizendo “sim, senhor”. Mas os jovens rebeldes não existem mais. Ou canalizaram a adrenalina para as dores de cotovelo. Os pequenos burgueses estão apavorados. Nem o canudo de papel lhes assegura pão e água. E seus pais já não dispõem do numerário para lhes permitir alçar-se embalados pelos sonhos novos.
A avalanche capitalista não tem vísceras. Hoje, a grana só sobra na mão de meia dúzia, que dominou geral, submetendo os do meio, urbanos e suburbanos, a esterco do cavalo do bandido. Até os intelectuais e artistas perderam o charme e alugam-se sem brilho a qualquer mecenas.
Há um estado novo guardado e gerenciado por intrépidos arrivistas, punguistas de alta linhagem e velhas raposas. Da mescla desses acadêmicos da esperteza, temidos em todos os poderes e em todos os entes, resulta isso que está aí.
A sorte é que a história é implacável. Para todos e qualquer um subsiste a fatalidade do desmoronamento das casas alicerçadas no charco. Foi assim com os intolerantes de coturnos; assim será também com os mocinhos de colarinho e macacão que os sucederam.
coluna@pedroporfirio.com

sábado, 24 de maio de 2008

Espírito de Porco


Alguns flamenguistas vão a Buenos Aires torecer contra o Fluminense. Essa atitude expõe o sentimento de rivalidade que move o ser humano, inclusive entre os que padecem os mesmos sofrimentos. É bonito isso? (FOTO DO JORNAL EXTRA DO RIO)
MINHA COLUNA NO JORNAL POVO DO RIO DE 26 DE MAIO DE 2008
Não tenha dúvida: o “espírito de porco” predomina em muitas de nossas atitudes, sem que as pessoas tenham parado para pensar em suas conseqüências.
Escrevo sobre tal fenômeno humano motivado pela leitura de um acontecimento aparentemente circunscrito ao mundo do futebol. Um grupo de flamenguistas vai gastar alguns trocados para ir a Buenos Aires engrossar a torcida do Boca Junior contra o Fluminense, só porque não consegue administrar o sucesso do rival, ainda mais depois do grande fiasco quando o América do México impôs uma derrota humilhante ao time que já entrou em campo certíssimo de sua classificação para as semifinais da Taça Libertadores.
Você dirá que não é a primeira vez e que tudo acontecerá sem que os 40 integrantes da “Fla-Boca” percam a esportiva. E que também já aconteceu de torcidas de outros times cariocas rezarem para que o Flamengo derrapasse frente a adversários de outros Estados e de outros países.
Isso eu até admito. Mas se você tomar esse exemplo e for passar em revista o cotidiano dos seres humanos terá o desprazer de constatar que a inveja e a competição parecem cada dia mais presentes.
Esse sentimento negativo é alimentado igualmente pelo personagem que se sai melhor na vida. É comum um vitorioso, seja no que for, tripudiar sobre os que não chegaram lá. Temos então que o elemento de conflito mesquinho é alimentado de parte a parte.
É esse comportamento menor que me causa desconforto, até porque, como tenho observado com certa amargura, ele se manifesta com maior agressividade nas classes mais pobres, exatamente entre os que deveriam ser mais solidários entre si.
Por conta da banalização da rivalidade entre as pessoas mais modestas, em nível pessoal, todos saem enfraquecidos e quem tira proveito é o esperto que joga com a inviabilização de uma união de lutadores pela melhoria de suas condições de vida.
Os oprimidos já não se juntam para gritar. Acostumaram-se ao “salve-se quem puder”, nem que o preço desse caminho seja passar por cima dos seus iguais.
Ao procederem assim, os mais sacrificados estão absorvendo as ideologias e as idiossincrasias da classe mais favorecida, que, por sua natureza, pratica uma guerra sistemática entre si. Só que de barriga cheia.
Isso é o mesmo que o soldado norte-americano ir fazer guerra no Iraque. Ele mata e morre, mas quem se aproveita de sua batalha é a máfia do petróleo da indústria de armamentos.
Espero que você tenha me entendido. O fato de ser BANGUENSE me ensinou muito, tanto que vibrei com a belíssima vitória do Fluminense sobre o São Paulo e torço para que o único clube brasileiro na competição seja o campeão do mundo.
É mais uma afirmação do nosso esporte, que dá mais visibilidade internacional à nação brasileira, assim como o sucesso olímpico fortalece a imagem de Cuba.coluna@pedroporfirio.com

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Náuseas que os nostálgicos da ditadura provocam


Na noite de 30 de abril de 1981, durante um show de música popular para 20 mil jovens, uma bomba explode dentro de um automóvel que manobrava no estacionamento do Riocentro, na Barra da Tijuca. Morto no seu interior o Sargento Guilherme Pereira do Rosário; gravemente ferido abandona o veículo semidestruído o Capitão Wilson Luís Chaves Machado, ambos do Destacamento de Operações de Informações do 1º Exército sediado no Rio de Janeiro. Foi quando a ditadura começou a cair, em meio a indignação de todo o país.
MINHA COLUNA NA TRIBUNA DA IMPRENSA DE 23 DE MAIO DE 2008
“Quando todos os países que passaram por uma ditadura militar já abriram seus arquivos relacionados a este período, o Brasil é o único que se recusa a mexer em tais documentos e, por isso, é acusado de obstruir essa apuração”.
Jair Krischke, ativista dos direitos humanos no Rio Grande do Sul.
Hoje, bem que ia voltar a falar da Varig e do Aerus, para cobrar o desdobramento da promessa do presidente Luiz Inácio, no Peru, de chamar à responsabilidade os donos do duopólio aéreo e periféricos.
Cheguei a enviar mensagem a respeito para o bravo comandante Marcelo Duarte, que está agora (eu não sabia) tentando sobreviver em Luanda, capital da africana Angola castigada por uma guerra civil fomentada pelo sistema internacional.
Mas um e-mail boçal que foi repassado por quem não parece como tal me deu ânsia de vômito. Era uma “ficha” do período em que o ministro Carlos Minc, na plenitude da sua juventude, dignidade, inconformismo e despojamento, entregou-se à luta armada contra a ditadura.
Nessa correspondência, fazem referência à sua participação na ação de 13 jovens, na casa do “Dr. Rui”, ou seja, da amante do governador Adhemar de Barros, tido, havido e assumido como o maior ladrão dos dinheiros públicos do país.
A primeira reação que tive foi estranhar a falta de qualquer comentário, em tudo que todos falaram sobre os “subversivos” daqueles idos, a respeito da origem do dinheiro, que era apenas parte da famosa “caixinha do Adhemar”.
Não falam porque não querem cuspir no prato que comeram. Aqueles 2,4 milhões de dólares eram café pequeno diante da soma que o mesmo corrupto de carteirinha disponibilizou para comprar muitos dos que aderiram ao golpe militar de 1964.
Ódio aos sobreviventes
Mas não é só isso. Toda hora, como que querendo justificar os assassinatos de torturadores pervertidos – como o que contava os pedacinhos de suas vítimas – alguns nostálgicos daquele regime ilegítimo e ilegal mandam e-mails em que destilam todo o ódio pelos sobreviventes da sanha ditatorial.
Ficam especulando se os jovens entraram na liça antes ou depois do AI-5, como se o regime de 64, que cassou, perseguiu e matou desde aquele trágico 1 de abril, tivesse alguma legitimidade.
Vamos ser claros e paremos com meias verdades: o país vivia a plenitude do regime de direito quando, com a ajuda ostensiva do governo norte-americano, que mandou uma frota de guerra para o nosso litoral na “Operação Brother Sam”, um grupo de militares derrubou o presidente constitucional, cuja posse não conseguiram impedir em 1961, devido à coragem do então jovem governador Leonel Brizola.
O lamentável é que o golpe, com os requintes de surpresa e traição, tenha triunfado em menos de 24 horas sem que, como aconteceu em outros países, os legalistas de então tenham resistido, como queria Brizola, razão pela qual se tornou o homem marcado para morrer pelos golpistas mais descontrolados.
Vamos ser mais claros ainda: desde o momento em que rasgaram a Constituição, os usurpadores do poder assumiram o caminho da ilegalidade e do arbítrio, única forma de se sustentarem no poder. Lutar contra a ditadura, desde o seu primeiro dia, era obrigação de todos os brasileiros.
A juventude por um sonho
Infelizmente, esse tarefa acabou sobrando para um punhado de bravos, jovens que abriam mão de sua vida “burguesa”, do seu futuro promissor, na esperança de que, com um 38 na mão, pudessem enfrentar 150 mil militares das três armas, muitos deles treinados na Escola das Américas do Pentágono e doutorados em tortura pela CIA. Enquanto muitos se acovardavam e até ajudavam (e se ajudavam) o regime, eles partiram para o confronto, como modernos quixotes.
Continuemos procurando aclarar ainda mais: anistia jamais poderá se aplicar a quem, na condição de servidor público, civil ou militar, tenha ultrapassado os limites de seus deveres e se dedicado a práticas de torturas dentro de instalações policiais e castrenses.
A propósito, transcrevo aqui trecho de uma entrevista de Jair Krischke, ativista dos direitos humanos no Rio Grande do Sul, comentando uma ordem de prisão da Justiça italiana contra alguns militares brasileiros.
“No Uruguai, neste exato momento em que nós estamos conversando, temos na prisão um ex-presidente da democracia, um ex-presidente da ditadura, um ex-ministro de Relações Exteriores, junto com vários oficiais do exército. Na Argentina, outros generais e coronéis estão presos. No Chile, é a mesma coisa. No Brasil, até agora, nem o Cabo da Guarda foi molestado pela Justiça brasileira”.
Terrorismo da repressão
Além disso, pouco se fala dos atos de terrorismo explícito promovido por militares e grupos da comunidade de informação. Ou você não ouviu falar da bomba do Riocentro e do acobertamento do Capitão Wilson Luís Chaves Machado, do DOI do 1º Exército, que a transportava juntamente com o sargento Guilherme Pereira do Rosário, morto com a explosão e enterrado com honras militares? Por pouco esses celerados não causaram milhares de mortes num show para comemorar o dia do trabalho em 1981, com a presença de 20 mil pessoas.
E a bomba que destruiu as oficinas a redação desta TRIBUNA DA IMPRENSA em 26 de março de 1981? Até hoje, este jornal sobrevive heroicamente sem que tenha sido ressarcido pelos prejuízos sofridos. E não me consta que esses “defensores da ordem” tenham se pronunciado pelo menos em defesa do direito à indenização. Não há notícias de que as grandes redes de televisão, que a qualquer constrangimento brandem o direito à informação, estejam empenhadas nessa reparação, devida há 27 anos.
E a cartas-bombas que no mesmo dia 27 de agosto de 1980 explodiram na OAB (matando a secretária Lyda Monteiro), no gabinete do vereador oposicionista Antônio Carlos de Carvalho, da Câmara Municipal do Rio de Janeiro, e na redação do jornal “Tribuna Operária”.
Você sabe o que os grupos ligados à repressão fizeram com o bispo de Nova Iguaçu, no dia 2 de setembro de 1976? Incomodados com sua postura, no mesmo mês em que o general Geisel cassou o mandato do deputado Lysâneas Maciel, dom Adriano Hipólito foi seqüestrado, despido, pintado de vermelho e abandonado nu, à noite, numa estrada deserta de Jacarepaguá. O carro que dirigia foi explodido por uma bomba na porta da CNBB, no largo da Glória.
A violência da ditadura não teve limites. Criminosos visíveis e invisíveis não tiveram dó, nem piedade. Seus excessos revestiram-se de requintes de sadismo e perversão. Tratar de inventariar essa página suja da história não é nenhum revanchismo. Buscar a punição de verdadeiros monstros é o mínimo que devemos às vítimas de suas torpezas e às gerações criadas sob o medo e o silêncio sepulcral. É uma providência saneadora que o mundo civilizado espera.
coluna@pedroporfirio.com

Haja feriado: no dia santo, os cristão preferem os bares e a praia


MINHA COLUNA NO JORNAL POVO DO RIO DE 23 DE MAIO DE 2008

O que vou escrever talvez lhe choque, talvez desperte a fúria clerical, mas alguém precisa pôr o dedo na ferida, pagar o preço da honestidade e da coerência.
É o seguinte: acho que não é certo paralisar a vida econômica do país com certos feriados, como o de ontem. E duvido que você mesmo saiba da verdadeira razão desse “dia santo”, que só pode acontecer numa quinta-feira, garantia do enforcamento na sexta e de uma desfiguração da vida das cidades.
Você viu como ficam nos bares na véspera do feriado? Acha que alguém vai se ligar no rito da Eucaristia? Sem essa, cara pálida. Ontem deu praia no Rio e na maioria das cidades brasileiras. Era nessas areias paradisíacas, contemplando as imagens mundanas de corpos esculturais, que estavam os filhos de Deus.
Hoje, não vai ser diferente. Depois que inventaram o “direito ao feriadão”, aí liberou geral. Por trás da idéia do feriado prolongado, coisa dos últimos 30 anos, está o investimento da especulação imobiliária nas praias do interior.
Só no ano passado, tivemos 9 feriadões. Este ano, 6. Para você ter uma idéia: além de nossas próprias e sagradas férias trabalhistas (que querem tirar), em 2007, tivemos 115 dias no bem bom. Em 2008, a previsão é de 115 dias em casa.
Sabe o que significa isso? Em primeiro lugar, menos emprego num país em que os desempregados estão saindo pelo “ladrão”, com índices recordes, como 44% de jovens atrás de qualquer coisa para levar algum para casa.
Mês que tem feriado causa uma perda de 8 a 10% no faturamento das empresas, com maior prejuízo para a indústria e o comércio fora dos shoppings. Em cada feriado só o comércio perde em torno de R$ 180 milhões no Estado do Rio. Até as lojas dos shoppings também perdem, embora abram em meio expediente.
Em 2007, de quinta (Dia da Proclamação da República a terça-feira (Dia da Consciência Negra), somente os comerciários perderam de R$ 7,5 milhões a R$ 15 milhões em comissões, na cidade do Rio, responsável por 57% das vendas do Estado. A Associação dos Lojistas de Shoppings calcula que a redução nas compras chegue a 50% nos quatro dias imprensados pelos feriados. “Ou seja menos 20% de receita”, segundo Arthur Fraga, economista da Aloserj.
O Brasil tem feriado para dar e vender. Ao todo 14, entre nacionais e religiosos, isso sem contar com os estaduais e municipais, 4 para cada um. Eu disse religiosos? Não podia. Sério. O Brasil é um país laico, conforme o artigo 19, incisivo I da Constituição. No entanto, a Igreja católica pára o país cinco vezes por ano. Deus sabe disso? O que eu sei é que “Deus ajuda a quem cedo madruga”.
Estou muito à vontade para denunciar a hipocrisia e a demagogia desse monte de dias parados. Como vereador, votei contra os feriados de Zumbi e de São Jorge.
Curioso, um vereador não pode dar nome de rua, que não dói. Mas o feriado de São Jorge foi aprovado no sapatinho, em menos de 2 minutos, antes que eu pudesse impedir tal lei demagógica.
Voltarei oportunamente ao assunto.
coluna@pedroporfirio.com

quarta-feira, 21 de maio de 2008

A volta por cima dos ex-escravos da praça de táxis do Rio de Janeiro

Com a introdução em caráter pioneiro do sistema de GPS, a Libertaxi controla todos os seus táxis em tempo real através dos monitores do Centro de Operações. A inovação é tão revolucionária que você pode acompanhar uma corrda do seu computador via Internet (FOTOS DE RENATA GONÇALVES)
MINHA COLUNA NO JORNAL OVO DO RIO DE 21 DE MAIO DE 2008

Em 2000, o Rio foi sacudido por um movimento sem precedentes em sua história e de todo o país. Os taxistas auxiliares, que pagavam para trabalhar nos carros de verdadeiros exploradores (um deles tem 800 táxis), mobilizaram-se num movimento que denominaram "Diárias Nunca Mais" e ocuparam as ruas da cidade.
A situação desses profissionais era insustentável. Sem nenhuma garantia trabalhista, pagavam em média R$ 120 por dia, além do combustível e outras despesas. Ao final da jornada de até 15 horas, nem sempre conseguiam essa féria.
Um grupo resolveu mobilizar os colegas. Aí alguns taxistas bateram na porta da Câmara Municipal. Procuraram primeiro o ex-vereador Edson Santos, do PT.
O atual ministro da Igualdade Racial recusou-se a pegar a causa, alegando que era "polêmica" e não teria possibilidade de vingar, até porque o sindicato pelego (que vive do imposto sindical forçado de 33 mil profissionais) era controlado por empresas e pelos especuladores.
Frustrados, os taxistas recorreram ao então vereador Agnaldo Thimóteo. Este também recusou, alegando que essa "não era sua praia". Foi então que decidiram me procurar.
Como faço em qualquer situação, analisei criteriosamente o quadro e fiquei indignado: estava diante de verdadeiros escravos urbanos. Juntei-me de corpo e alma ao movimento e preparei um projeto de Lei, transformando os auxiliares em titulares de suas autonomias.
Na mesma proposta, extinguia o regime escravo das "diárias" e proibia a compra e venda das autonomias. O movimento ganhou corpo, enquanto travávamos o debate no plenário da Câmara. A máfia que explorava a praça de táxis montou um esquema para impedir a aprovação do meu projeto.
E ainda mandou emissários me procurarem com propostas de suborno milionárias, substituídas depois por ameaças de morte. Depois de usar de toda a minha garra e contando com a mobilização de milhares de profissionais explorados, aprovamos a Lei 3123, sancionada em 17 de novembro de 2000 pelo prefeito Luiz Paulo Conde.
Apesar da resistência do prefeito Cesar Maia, fomos ganhando em todas as instâncias até o Supremo, em 2004. Dessa vitória surgiu a cooperativa Libertaxi, formada por parte dos beneficiários da Lei.
Ontem, tive a oportunidade de ver a Libertaxi, a mais criativa cooperativa de táxis do Rio, introduzir o moderno sistema de GPS, pelo qual, entre outras novidades, o sistema calcula previamente o preço da corrida que,aliás, custa 20% a menos nos táxis dos ex-escravos (Todos com menos de três anos de uso), o que enseja um cadastro de mais de 200 mil passageiros. Com mais esse passo dado que não afeta a política de descontos, por iniciativa da diretoria presidida pelo ex-contador Carlos Alberto Fernandes, a frota da Libertaxi passa a ser mais completa do que os próprios "taxis especiais", que cobram quase o dobro das tarifas e têm monopólios de pontos como os aeroportos da cidade. Com ações desse alcance, esses profissionais do volante, que antes se matavam para pagar diárias extorsivas, mostram o que seria do Brasil se houvesse mais respeito aos seus trabalhadores.
LEIA REPORTAGEM DO JORNAL POVO DO RIO

domingo, 18 de maio de 2008

Lula, a aviação sem asas e a tragédia do Aerus

Lula falou em criar uma estatal aérea para salvar o setor e esqueceu que a solução está em resgatar a VARIG (CLIQUE NA FOTO E VEJA A MATÉRIA E VÍDEO DE LULA EM LIMA)

MINHA COLUNA NA TRIBUNA DA IMPRENSA DE 19 DE MAIO DE 2008

Clique aqui e veja também a reportagem do Jornal Nacional sobre o Aerus (video enviado por Paulo Resende)

"Tudo o que eu não quero é que eles sejam tão inoperantes nessa área que comecem a fomentar na minha cabeça a idéia de que o Estado vai ter de criar uma nova empresa. Eu não quero fazer. Mas se os empresários não tiverem ousadia, a gente terá que ter ousadia".
Luiz Inácio Lula da Silva, Lima, Peru, 17 de maio de 2008.
Finalmente caiu a ficha. Em improviso numa reunião com governantes em empresários do Peru, o presidente Luiz Inácio admitiu que a aviação comercial brasileira vai mal das asas. Lá, em face de reclamações do seu colega peruano, com todas as letras que há possibilidade do Estado criar uma empresa aérea, em face da inoperância do “duopólio” TAM-Gol que controla não apenas os pousos e decolagens, mas também os próprios órgãos de fiscalização do país.
É possível que essa manifestação não passe de mais uma bravata do chefe de um governo que tem a maior responsabilidade pelo caos aéreo, ao abandonar à própria sorte a maior e mais séria empresa aérea brasileira, entregue a um grupo de aventureiros de mão beijada, enquanto seus empregados e aposentados eram jogados na rua da amargura sem nenhum direito, em nome da nova Lei de Recuperação das Empresas, gerada também no ventre desse governo.
O massacre do Aerus na TV
Essa fala coincidiu com uma reportagem exibida na noite de sábado pelo poderoso JORNAL NACIONAL, mostrando o desastre social a conseqüência mais perversa do trágico desfecho do caso: finalmente, a maior rede de tevê mostrou a seus milhares de telespectadores a situação de verdadeira miséria a que foram submetidos 17 mil profissionais da aviação, cuja contribuição, paga ao longo de décadas, evaporou-se no seu fundo de pensão, o Aerus, numa punga pela qual o governo é o principal responsável.
A matéria que chegou aos lares dos brasileiros na noite de sábado é o mesmo que venho dizendo aqui há quatro anos. Como foi transmitida por uma poderosa rede nacional de televisão, tenho a esperança de que o impacto causado possa abrir os olhos das autoridades e dos políticos, como o senador Paulo Paim, presidente da Comissão dos Direitos Humanos do Senado, que conseguiu reverter a anunciada falência do Fundo Portus com uma audiência pública e boas negociações junto ao governo. Essas articulações tiveram êxito porque ali os sindicatos estavam realmente do lado dos 13 mil portuários ameaçados.
A salvação do Portus
Na primeira quinzena de maio, eu mesmo avisei do risco que estavam correndo os beneficiários do fundo Portus. A posição técnica do secretário de Previdência Complementar do Ministério da Previdência, Ricardo Pena Pinheiro, era de que nada se poderia fazer, porque os “problemas que originaram o rombo no Portus continuarão” mesmo que o governo injete algum dinheiro.
Ao contrário de sua opinião “técnica” , o governo do presidente Luiz Inácio mandou jogar R$ 400 milhões no Portus, a fim de que o fundo possa iniciar sua recuperação. Essa decisão teve CARÁTER EMINENTEMENTE POLÍTICO e decorreu principalmente da firmeza como a Federação Nacional dos Portuários e os sindicatos da categoria se posicionaram, chegando a ameaçar com uma greve nos portos.
Essa, no entanto, não foi a postura do Sindicato Nacional dos Aeronautas, cujos dirigentes não foram nada solidários com o pessoal da Varig e ainda deram voto favorável na Assembléia dos acionistas que legitimou a entrega da VARIG ao fundo abutre dos Estados Unidos, representado pelo chinês Lap Chan.
Mistificação persiste
A decisão do governo em socorro dos portuários, que todos apoiamos, deixou os aeronautas e aeroviários na maior indignação, pois sentiram-se injustiçados como o que chamaram de dois pesos e duas medidas. Para o Portus, pelo qual se empenharam políticos como o senador Mercadante e três ministros de Estado, a resposta do governo veio na hora “h”, passando por cima da desastrada Secretaria de Previdência Privada do MTAS.
Para o Aerus, o governo virou as costas. Como entender isso?O Sindicato dos Aeronautas tratou de dar uma explicação. Os dois fundos são regidos por leis diferentes. O Portus tem estatais como patrocinadoras. O Aerus, não.
Será por isso? E o fato da as empresas aéreas serem concessionárias de serviços públicos, regulamentadas e controladas diretamente pelas autoridades aeronáuticas? E a dívida bilionária do governo com a VARIG, já confirmada em três instâncias, dependendo tão somente agora do STF?
Digam o que disserem, mas a decisão em relação ao Portus, que não podia ser diferente, foi POLÍTICA. No dia em que o Sindicato dos Aeronautas mudar de postura, esquecendo que seus dirigentes são do partido do governo, no dia que assumir frontalmente a causa da sua categoria, a posição do governo será outra.
Aviação sem asas
Voltamos à fala do presidente Lula. Se ele estiver sinceramente disposto a resgatar as asas da nossa aviação comercial, o caminho está em reconhecer o erro da omissão passada, que favoreceu a TAM e a Gol, e chamar de volta o pessoal da VARIG, cujas associações profissionais sempre tiveram soluções simples e viáveis para fazer a companhia voltar a voar com todas as turbinas.
Em maio do ano passado, numa audiência pública que promovi na Câmara Municipal, o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, assumiu o compromisso de intermediar junto ao governo a recuperação das empresas e do fundo Aerus.
Posteriormente, em audiência com os representantes das associações de pilotos, comissários e mecânicos de vôo, Lupi ouviu do comandante Elnio Borges, na minha presença, a sugestão de uma fórmula prática e inteligente para que o governo pague a dívida com a VARIG sem precisar fazer nenhum sacrifício de caixa.
Lupi abraçou a idéia na hora. Procurou o advogado geral da União, mas este não foi autorizado a negociar um acordo. Ao contrário, a ordem do Planalto é de recorrer a todos os recursos para protelar a decisão num processo que se arrasta há mais de 15 anos.
Na matéria do JORNAL NACIONAL, o atual interventor do Aerus, Aubiergio Barros, disse que única solução para o sofrimento dos seus beneficiários está no pagamento da dívida do governo com a VARIG, que repassaria os R$ 3 bilhões devidos ao fundo.
Isso é evidente. Se Lula não ficou só no blefe, poderá matar vários coelhos de uma só cajadada. Basta chamar o pessoal da VARIG, reunido no TGV, que ainda poderá salvar a empresa e a própria aviação comercial brasileira.
coluna@pedroporfirio.com

Com a dupla jornada, a mulher trabalha mais do que o homem

MINHA COLUNA NO JORNAL POVO DO RIO DE 19DE MAIO DE 2008
Como já disse, um dos principais alvos da nova investida contra a previdência pública é a mulher. Querem porque querem jogar nas costas das mulheres e dos pensionistas (em sua quase totalidade viúvas) a maior responsabilidade pelo déficit previdenciário, que não existe e estão dispostos a apelar para a ignorância: proporão o aumento do tempo de trabalho da mulher e a redução drástica da pensão, incluindo a possibilidade de reduzir esse benefício à viúva maior de 50 anos, que não tenha outra renda ou as viúvas que tenham filhos menores.
Uma pesquisa do IBMEC de São Paulo confirma o que tenho dito aqui: ao contrário do que tentam incutir, a mulher trabalha mais do que o homem, em função da dupla jornada: além do emprego de 8 horas por dia, ela é obrigada a responder por sua condição de dona de casa e de mãe.
Mulheres com jornada semanal de 40 horas ou mais no mercado de trabalho trabalham quase três vezes mais em serviços domésticos do que homens que cumprem a mesma jornada de trabalho. Enquanto eles trabalham, em média, 5 horas semanais fazendo serviços em casa, elas dedicam 18 horas por semana às mesmas tarefas.
O resultado é apontado por estudo do IBMEC de São Paulo para avaliar as desigualdades entre homens e mulheres quanto à participação no trabalho dentro e fora casa.
O levantamento foi feito a partir de dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2006, do IBGE, e levou em conta informações de 206,5 mil pessoas com renda familiar média de R$ 1.634. A idade média dos chefes de família e seus parceiros é de 46 e 41 anos, respectivamente.
Entre os homens, 85,06% têm jornada de 40 horas ou mais por semana. Na média eles, dedicam 5 horas semanais ao serviço doméstico.
O percentual de mulheres que cumprem horário de 40 horas ou mais no trabalho é menor: 56,29%. Entretanto, elas dispensam 18 horas semanais para as tarefas domésticas. "Comparando mulheres e homens, casados ou não, a diferença persiste. A mulher trabalha em casa, no mínimo, o dobro do que o homem. Dependendo da jornada no mercado de trabalho, essa diferença chega a três ou até quatro vezes", diz Regina Madalozzo, pesquisadora do IBMEC e uma das autoras do estudo. Renda, educação e idade são três fatores que explicam, segundo ela, as desigualdades entre homens e mulheres ao cumprir jornada em casa.
Esse estudo deixa de apontar que na mesma função a mulher ganha menos, embora seja cada vez maior a sua contribuição ao mercado de trabalho. Se pesquisarmos bem, as mulheres ainda têm mais “a receber” numa previdência que é parte do sistema de seguridade social.
Considerar esses números é indispensável na avaliação da questão da aposentadoria da mulher.
coluna@pedroporfirio.com

sexta-feira, 16 de maio de 2008

O conjunto da tropa e os porões da ditadura

Doutores do mal: Félix Freire (à esq.), Aldir Maciel (ao lado) e José Brant (à dir.) são os homens que se destacaram nos órgãos de repressão pela frieza e morbidez receberam licença do governo para matar e ocultar cadáveres de militantes do PCdoB, da AP, da VPR, do PCB (revista ISTO É, 2004)
MINHA COLUNA NA TRIBUNA DA IMPRENSA DE 16 DE MAIO DE 2008


“Nessa hora tem de agir com muita inteligência para não ficar vestígio nessa coisa”, General Ernesto Geisel, ao comentar a prisão e a morte de um grupo de sete pessoas, vindas do Chile e da Argentina, capturadas no Paraná, segundo Élio Gásperi.
Um oficial da reserva, entre os muitos militares que lêem a minha coluna e com quem troco e-mails, repassou um vídeo com o trabalho que o Batalhão de Engenharia do Exército vem fazendo na rodovia BR-101, entre Recife e Natal.
No filme, o apresentador Alexandre Garcia mostra qualidade da obra e pergunta por que as empreiteiras privadas não fazem igual, com os mesmos cuidados. “Amigos, esta é para repassar com muito orgulho, por eu ser militar. Os elogios aqui ditos pelo Alexandre Garcia, nesta reportagem, muito autênticos, são válidos e se aplicam a toda as nossas Forças Armadas”.
Não é de hoje que o Exército presta tão relevantes serviços ao país. Foi devido ao pioneirismo dos militares, que passamos a formar depois os engenheiros civis.
Faço questão de abrir esta coluna com esse reconhecimento para que fique claro: os militares profissionais, legalistas, patriotas e defensores das instituições, que sempre foram a grande maioria da tropa, nada têm a ver com o grupo de celerados e ambiciosos que manteve o país sob o terror de uma ditadura monitorada diretamente pelos Estados Unidos.
Por isso mesmo, age de má fé quem insiste em lançar o conjunto da tropa e a instituição contra a indispensável apuração de todos os excessos praticados no interior das instalações militares, incluindo a localização dos corpos dos mortos, que foram enterrados às escondidas e de forma indigna para esconder as barbaridades de responsabilidade do regime ditatorial.
Quem é quem
Os militares legalistas serão os mais beneficiados com a abertura dos arquivos daquela época. Os documentos mostrarão que os excessos foram restritos a um pequeno grupo dominado muito mais por impulsos perversos, por sentimentos revanchistas, do que pela natureza de suas tarefas – a defesa do estado ditatorial que, aliás, nunca foi ameaçado pelo meio milhar de brasileiros que pegaram em armas.
Pode até ser que muitos militares tenham consentido nos excessos, sob influência da propaganda maciça disseminada “para o público interno”, com a utilização de técnicas de lavagem cerebral ensinadas na Escola das Américas, o centro de treinamento mantido pelo Pentágono durante muitos anos no Panamá, onde fizeram cursos milhares de oficiais do Continente.
Além disso, o governo ilegal, imposto pelos tanques, dispunha de um leque de alternativas para imobilizar a tropa. Preso de Marinha, pude testemunhar o constrangimento de muitos oficiais, sargentos e cabos diante dos fatos consumados sobre os quais tinham de silenciar, em nome da “segurança nacional” e para não serem perseguidos.
Acredito até hoje que o comandante Lindemberg Pereira, do Presídio Naval, falava com toda sinceridade quando jurava que essa história de tortura era discurso subversivo. Potiguar, filho de um taxista, com um irmão chamado Lenine, ele procurava administrar a pressão que recebia para “apertar” os presos políticos que iam para lá depois de “interrogados”, e, como eu, eram jogados na Quinta Prisão, a mesma onde um dia ficou Tiradentes.
Foi o tenente Gildásio, oficial-dentista do Batalhão Humaitá, quem ligou para a professora Sandra Cavalcanti, cuja solidariedade jamais deixarei de reconhecer, para avisar que eu estava “seqüestrado”, ali, na Ilha das Flores.
Nas horas em que foi oficial do dia – de sábado para domingo da última semana de junho de 1969 – por sua conta a risco, me tirou do catre em que estava algemado, sob mira da metralhadora do soldado Gilson, e me garantiu um relaxamento de algumas horas.
Por coincidência, o tenente Gildásio era o mesmo profissional que se habilitara, numa seleção imparcial, ao cargo de dentista da Fundação Paulo Bittencourt dos empregados do Correio da Manhã, quando eu a presidia. Multado, de origem humilde como muitos dos que ingressam nas Forças Armadas, ele não ficou muito tempo naquele centro de torturas sob a batuta do comandante Clemente José Monteiro Filho, um capitão de mar e guerra fuzileiro naval,que coordenava pessoalmente os suplícios e ainda fazia questão de exibir suas “presas” a visitantes estranhos.
Aos oficiais que tiveram que calar ou simplesmente foram transferidos para empresas estatais e outras funções civis, deve incomodar até hoje todo aquele espetáculo deprimente, que encheu de constrangimento boa parte da tropa.
Os mesmos de sempre
Àquela época, os mandantes eram praticamente os mesmos coronéis signatários do manifesto contra o ministro João Goulart, em 1953, já liderados pelo então tenente-coronel Golbery do Couto e Silva; os mesmos militares que bancaram a crise de 1954, quando o presidente Vargas foi levado ao suicídio; os mesmos generais que tentaram impedir a posse de João Goulart em agosto de 1961, e os mesmos oficiais da Aeronáutica dos levantes de Aragarças e Jacareacanga, entre os quais o brigadeiro João Paulo Moreira Burnier, e os mesmos almirantes que quiseram impedir a posse de Juscelino em 1955, sob a liderança de Carlos Pena Botto.
Se somar, não chegam a duzentos. Porque eles trataram de criar mecanismos para impedir o florescimento de lideranças militares independentes, como a do general de divisão Albuquerque Lima, impedido de “disputar” a sucessão do general Costa e Silva, por só ter três estrelas.
Um desses mecanismos foi o sistema de remanejamento automático de generais e coronéis, que não podiam ficar mais de dois anos consecutivos na tropa. Conseguiram, assim, que os divergentes fossem imobilizados, de tal forma que as insatisfações acabaram sendo canalizadas para alguns dissidentes, como o general Euler Bentes Monteiro, que quando coronel assinou o manifesto contra Jango, e para o general Hugo Abreu, que participou da última fase das operações de extermínio no Araguaia.
Assim também, não vejo porque as gerações de hoje, que têm demonstrado absoluto respeito à Constituição, podem se sentir atingidas pelas revelações das aberrações de maus colegas, muitos dos quais se orgulhavam das matanças, como revelou à revista ISTO É, em 2004, Marival Chaves Dias, ex-agente do Doi-Codi, que acompanhou pessoalmente os espetáculos de sadismo e brutalidade: ““O Doutor Magno sentia um prazer mórbido em me contar que apostava com outro carcereiro quantos pedaços ia dar o corpo de determinado prisioneiro executado. As impressões digitais eram as primeiras partes a serem cortadas ”.
coluna@pedroporfirio.com
CLIQUE AQUI E LEIA AS REVELAÇÕES DO EX-AGENTE MARIVAL CHAVES DIAS NA REVISTA ISTO É

Proteção ao trabalho pára no STF


Lupi na reunião da Organização Internacional do Trabalho: em busca do tempo perdido.
MINHA COLUNA NO JORNAL POVO DO RIO DE 16 DE MAIO DE 2008

Durma-se com esse barulho. Todo o esforço que envolve o ministro Carlos Lupi, do Trabalho, e as centrais sindicais para a aprovação no Congresso da Convenção da OIT que protege o trabalhador contra a demissão imotivada seria desnecessário se o Supremo Tribunal Federal tivesse julgado a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.625, proposta em 1997 pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura contra decreto do então presidente Fernando Henrique Cardoso, revogando o ato.
Em outras palavras: a convenção já havia sido ratificada pelo Congresso Nacional e chegou a vigorar por oito meses, até que o professor, ao gosto do sistema internacional, baixou decreto revogando outro, que ele mesmo havia assinado.
A Convenção 158 da OIT passou a vigorar no Brasil com o Decreto 1.855, de abril de 1996, que foi editado após a ratificação da norma ser aprovada pelo Congresso. Ela, porém, não durou muito tempo. Em dezembro daquele mesmo ano, foi publicado no Diário Oficial o Decreto 2.100, no qual FHC decidiu voltar atrás e deixar o dito pelo não dito.
A ação da CONTAG foi levada ao plenário do Supremo em 2003 pelo relator Maurício Corrêa e chegou a ter o voto favorável do ministro Carlos Ayres de Brito. Mas saiu de pauta porque o ministro Nelson Jobim pediu vistas. Os dois se aposentaram e até hoje a ação permanece nas gavetas do STF.
É o que sempre digo. Quando se trata de beneficiar o povo, nada anda neste país, especialmente na Justiça. Quando é para o bem dos poderosos, aí é vapt vupt.
Em sua ação, muito bem fundamentada, a CONTAG argumentou que a convenção não poderia ser revogada por ato unilateral do presidente, porque a Carta Magna conferiu ao Congresso a competência exclusiva para resolver sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretassem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional. "Os tratados normativos, neste caso a Convenção 158, devem, para a sua aprovação, ser primeiramente submetidos ao Congresso Nacional. Sendo um ato jurídico complexo a sua ratificação, já que depende de ser primeiro aprovado pelo Congresso, a sua denúncia, no mesmo sentido, deve, obrigatoriamente, ser submetida e aprovada pelo Congresso", sustentou a entidade.
Na Adin, a CONTAG alegou que o decreto de FHC atingiu diretamente os trabalhadores do campo. "A Constituição de 1988 igualou os trabalhadores rurais aos trabalhadores urbanos (…). Assim, a proteção contra a despedida imotivada inscrita na Convenção 158 da OIT aplica-se também aos trabalhadores rurais assalariados. A denúncia da Convenção, ainda mais quando efetuada em desrespeito aos preceitos constitucionais, prejudica todos os trabalhadores brasileiros, entre os quais os assalariados rurais, em um dos seus direitos fundamentais, que é o da relação de emprego contra a despedida arbitrária".
coluna@pedroporfirio.com

terça-feira, 13 de maio de 2008

Aposentados entre Céu e o inferno

MINHA COLUNA NO POVO DO RIO DE 14 DE MAIO DE 2008
Tenho minhas razões para insistir nessa questão das aposentadorias e pensões dos brasileiros. Porque neste momento estamos entre o céu e o inferno.
De um lado, o senador Paulo Paim conseguiu aprovar no Senado duas mudanças que podem favorecer a todos os segurados do INSS. Numa, acaba com o fator previdenciário, a ferramenta que pode fazer você se aposentar com metade do que teria direito em função de suas contribuições.
Noutra, estabelece um critério de justiça no reajuste de todos, evitando essa situação vexaminosa em que são dados dois tipos de aumentos, atingindo diretamente quem ganha mais do que o mínimno.
Já os donos do poder estão recorrendo a todo tipo de engenharia econômica para reduzir ainda mais os ganhos dos aposentados e pensionistas. Há realmente um grupo de trabalho tentando montar um discurso que explique mudanças na idade de aposentadoria de homens e mulheres e a redução das pensões, que se seriam drasticamente limitadas.
O grave em todo esse complô é que usam sempre os mesmos argumentos mentirosos sobre o suposto déficit da Previdência, omitindo que ela é parte da seguridade social como um todo.
É sobre isso que insisto em lembrar que o modelo brasileiro de aposentadorias e pensões é ainda o mais inteligente do mundo, o mais viável do ponto de vista do real benefício social.
Primeiro, porque, dentro do sistema de seguridade social, alcança milhões de brasileiros, como os trabalhadores rurais, maiores de 65 anos e portadores de deficiência, que são beneficiados, independente de terem contribuído. No caso das aposentadorias rurais, elas já chegam a 7 milhões de pessoas.
Segundo, porque estabelece um conjunto de fontes de receita, que não se limitam ao que é descontado dos nossos salários e recolhidos pelas empresas diretamente ao INSS.
Ao invés de maquinar cortes de benefícios, o governo deveria era encontrar uma fórmula de atrair os 46 milhões de brasileiros que vivem na informalidade, representando 53% de toda a nossa mão de obra ocupada.
Quando eu digo que tudo o que estão fazendo contra a previdência pública é para facilitar o lado dos grandes bancos, que têm carteiras robustas de previdência complementar, não estou falando por acaso.
Num estudo muito bem fundamentado, Floriano José Martins, presidente da Fundação Anfip (fiscais da previdência) foi muito claro: se o fator previdenciário “não for alterado, em pouco tempo teremos implantado no Brasil, por vias transversas, uma velha proposta dos organismos internacionais, de restringir a Previdência Social a uma cesta básica com benefícios de até três salários mínimos, reservada toda a demanda por maiores benefícios aos regimes de capitalização privados, com tudo o que isto representa de risco para o participante, e de lucro para o mercado financeiro”.
coluna@pedroporfirio.com

domingo, 11 de maio de 2008

Massacre na Previdência: os novos alvos são as mulheres e as pensões

MINHA COLUNA NO JORNAL POVO DO RIO DE 12 CDE MAIO DE 2008
O exemplo da Rússia pós-socialismo, onde a viúva só recebe pensão se tiver mais de 55 anos e nenhuma outra renda, é apresentado por certos grupos como uma "solução" para a falácia do déficit da Previdência no Brasil.

Não tenha dúvida: os maiores alvos da nova ofensiva contra a Previdência Pública são as mulheres e os pensionistas em geral. O recado já foi dado através de uma coluna em um desses jornais que vive repetindo a falácia do chamado déficit previdenciário.
O colunista cita exemplos para tentar apontar incoerências no fato de que se a mulher vive mais, não pode ser aposentar antes dos homens. E ainda serve um menu de exemplos para dizer que a previdência no Brasil é generosa mais da conta com os pensionistas.
Ao citar estudo do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas, segundo o qual o país gasta mais de 3% do PiB com pensões, ele citou exemplos de outros países, onde o sistema de assistência aos viúvos é limitado:
“Se adotássemos o critério da Rússia, em que as pensões são pagas apenas aos viúvos e viúvas de mais de 55 anos, sem trabalho, reduziríamos em 58% o número de benefícios, e em 54% nossos gastos”.
Os argumentos contra a aposentadoria das mulheres aparentam certa lógica, porque, como é de lei, ninguém defende uma tese com o recurso da verdade, mas com o uso e a manipulação daquilo que pode servir à sua argumentação.
É muito cômodo dizer que a mulher tem uma expectativa de vida maior do que a do homem e, por isso, devia ter até mais tempo no batente.
Quem fala isso esquece de lembrar que a mulher vive a imposição da dupla jornada – isto é, além de trabalhar fora, é a responsável pela casa e pelas responsabilidades próprias da maternidade.
Omitem também que na mesma função, as mulheres ganham menos do que os homens e, o que é mais grave, segundo estudos da especialista Ana Maria Vasconcelos Nogales, “embora as mulheres vivam mais do que os homens, elas passam por um período maior de debilitação biológica antes da morte do que eles”.
Quando procuram lançar trabalhadores e aposentados contra seus companheiros de jornadas, os defensores do “arrocho previdenciário” pegam pesado e escondem o principal: dizer que a previdência social brasileira é deficitária é mentira das grossas, como demonstrou a economista Denise Lobato Gentil, na tese que defendeu junto ao Instituto de Economia da UFRJ em 2006:
“Em 2005, a receita da seguridade social foi de R$ 278,1 bilhões, ao passo que as despesas dos ministérios do Trabalho, da Saúde, da Previdência e da Assistência Social, para se usar um conceito mais amplo, incluindo ativos e inativos, foi de R$ 221,2 bilhões. Ou seja, um superávit de R$ 56,9 bilhões! Mesmo com a Desvinculação da Receita da União (DRU), que retira linearmente 20% dos ministérios, o ano passado foram desvinculados em torno de R$ 32 bilhões. Mesmo assim, sobram R$ 24,8 bilhões.Isso revela que o sistema da seguridade social de nosso país deu certo”.
O resto é manipulação para favorecer a previdência privada.
coluna@pedroporfirio.com

A poeira que dona Dilma levantou em nome da "companheira Estela"


Ao falar no Senado (na foto com o presidente Garibaldi Alves) da tortura porque passou a jovem Dilma (ficha no detalhe), em resposta a uma indagação policialesca do senador do DEM que serviu à ditadura, a ministra impôs-se pelo relato firme e sereno do sacrifício de uma geração que expôs a própria vida numa hora em que muitos dos que falam mal hoje daqueles dias estavam de mãos dadas com os donos do poder imposto pelos tanques. Sua fala emocionada foi um marco e reacende a lembrança de um período histórico que ninguém pode esconder, muito menos justificar. (CLIQUE NA FOTO E VEJA SUA FALA)
“Esse troço de matar é uma barbaridade, mas eu acho que tem que ser."
General Ernesto Geisel

A sra. Dilma Vana Rousseff Linhares, nascida em 14 de dezembro de 1947, ministra da Casa Civil do governo Luiz Inácio Lula da Silva, não é a mesma “companheira Estela”, que expôs a vida numa romântica luta armada que embalou os sonhos de uma geração disposta a derrubar a ditadura militar, sob influência da vitoriosa revolução cubana e das manifestações que varreram as ruas de todo o mundo em 1968.
Aos 58 anos, a filha do engenheiro búlgaro Petar Rosseav, que emigrou para o Brasil nos anos 30, é hoje uma referência do poder. Tida como a única pedra do PT para a sucessão de Lula em 2010, já se comporta como aquela que poderá ser a primeira mulher a presidir a República do Brasil.
Se ela fosse apenas uma carta para pavimentar a fórmula do terceiro mandato do sr. Luiz Inácio, ultrapassou esse papel por obra e graça do senador Agripino Maia, saído das entranhas da ditadura a que pretende renegar como o bando de maus-caracteres que se cevou naqueles idos e pendurou a conta exclusivamente nas costas dos militares.
De comum acordo com seus colegas de bancada, representantes das oligarquias e da mediocridade, o senador achou que podia pegar Dilma pelo pé ao lembrar que ela mentiu para os seus torturadores nos 21 dias que passou debaixo de porrada.
Foi aí que acabou prestando um grande serviço ao país. A resposta da ministra emocionou toda a sociedade, que tem uma dívida com todos os que sacrificaram sua juventude para enfrentar um regime de força, apoiado diretamente pela CIA e pelo sistema internacional.
E que, protegido pelo arbítrio, pela censura e pela cumplicidade, enriqueceu as oligarquias, endividou o país até a medula, entupiu as estatais de oficiais – que ganhavam também como se estivessem na ativa – e fez tudo o que o sistema internacional mandava para saciar a volúpia de poder que devorou seus aliados civis de proa, como Ademar de Barros, Carlos Lacerda e o próprio Juscelino (que apoiou a “eleição” do general Castelo).
Ser ou não ser
Ao contrário do sr. Luiz Inácio, que surgiu no bojo da “distensão” como um antídoto aos comunistas e aos trabalhistas, Dilma Rousseff participou diretamente da resistência, em todos os seus momentos. E só começou a adaptar-se à cartilha do poder quando, à frente do Ministério de Minas e Energia, deu continuidade aos leilões das áreas petrolíferas, iniciados no governo FHC como forma de abrir nossas jazidas ao capital estrangeiro.
Com o episódio do Senado, uma casa de grandes canastrões e raros legisladores, que conta no seu plantel milionário com suplentes sem voto, Dilma Rousseff entrou definitivamente na constelação shakspeareana da dúvida atroz.
Para ser presidente da República de um país que chegará aos 200 milhões de habitantes em 2011, com toda essa potencialidade econômica explosiva e uma Amazônia rica e cobiçada, a ex-guerrilheira terá de enquadrar-se numa pauta de compromissos, a menos que o senador negro Barack Obama seja eleito presidente dos Estados Unidos e mantenha o seu propósito de mudança radical, que é a essência da catarse que poderá protagonizar.
Eleita, ela poderá ser, na medida em que a oposição de direita tem a cara de bolacha do senador Agripino Maia, rabo preso e uma folha corrida vulnerável. E a oposição de esquerda está inteiramente confinada em função de uma realidade em que ideológico é o que menos conta. Além de que esse “ideológico” não tem uma formatação consistente e coerente.
É possível que, ao jogar Dilma no proscênio, Lula esteja em condições de operar nos bastidores a conclusão do projeto de “ajustes” prometido ao sistema internacional, que inclui o desmantelamento da legislação trabalhista, o enfraquecimento do Estado e das Forças Armadas, a sofisticada desnacionalização da Amazônia através da política de demarcação das terras indígenas iniciada pelo governo entreguista de Fernando Collor e o esvaziamento da Previdência Social pública.
Vasectomia política
Dilma cumprirá um papel de inocente útil no grande jogo sujo do poder. Embora seja comprovadamente uma pessoa íntegra e a corrupção seja uma das manchas maiores do governo atual, como foi também dos anteriores (só que agora não há mais boca pequena), a pré-candidata é também “um chega pra lá” nos chamados petistas históricos, alguns dos quais, como José Dirceu e Gushiken, já perderam a cerimônia e ingressaram no rendoso mundo do lobismo.
Isso tudo acontece porque as escolas da política verdadeira fecharam as portas, cedendo espaço a todo tipo de trampa e arrivismo.
E porque o período obscurantista serviu como uma grande vasectomia política, tornando estéril a vida pública decente.
Alguns dos meus leitores, pessoas inegavelmente sérias, padecem da síndrome da revanche dos tipos 1,2 e 3. Como não têm coragem cívica de admitir que os porões do DOI-CODI, Cenimar e CISA foram transformados em sádicos centros de tortura e morte, odeiam todos os sobreviventes daquele período em que, como disse um dia o general Dale Coutinho, primeiro ministro do Exército de Geisel, “o Brasil começou a melhorar quando começamos a matar”.
Esses leitores estão ainda hoje chocados com o desempenho da sra. Dilma Rousseff e a visibilidade que ganhou por apontar com todas as letras e todos os detalhes as agruras de uma quase menina nas mãos de torturadores depravados, que, entre outras coisas, faziam questão de despir suas vítimas para que a violência física fosse recheada de traumas inesquecíveis.
Independente de todo esse jogo pragmático de cartas marcadas, que desfigura a todos os que dispõem de qualquer nicho de poder, seja no Executivo, Legislativo ou no Judiciário, Dilma Rousseff entrou definitivamente para a lenda do respeito da cidadania, graças à firmeza com que desmascarou o ex-engenheiro da empreiteira EIT, que por essa condição e por rebento da oligarquia dos “Maias”, entrou para a vida pública ao ganhar de presente, por nomeação, a Prefeitura de Natal.
Como tudo pode acontecer, quem sabe, o Barack Obama possa ser presidente dos EUA e, por conseqüência, se ele não amarelar, possamos ter enfim um (ou uma) presidente no Brasil com sangue nas veias.
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quinta-feira, 8 de maio de 2008

A imolação macabra dos aposentados e pensionistas

Num passado remoto, numa certa aldeia, maiores de 70 anos eram levados para o pico de Narayana, onde ficam esperando a morte por congelamento. A imagem veio à cabeça do escritor Moacyr Scliar, a propósito do traamento dado aos aposentados no Brasil.

MINHA COLUNA NA TRIBUNA DA IMPRENSA DE 9 DE MAIO DE 2008
O que estão fazendo com os aposentados “lembra o filme A BALADA DE NARAYAMA, que se passa em uma pequena aldeia japonesa séculos atrás. Nessa aldeia, quem chega aos 70 anos é levado ao topo de Narayama, a nevada montanha próxima, para ali aguardar a morte por congelamento”.
Moacyr Scliar, escritor gaucho, membro da Academia Brasileira de Letras.
Bem que eu poderia falar da Justiça, desse novo vexame, a absolvição do fazendeiro que mandou matar a freira norte-americana Dorothy Stang, do fenômeno que passou três horas no hotel com três travestis e saiu “virgem”, do show montado para acompanhar as prisões dos assassinos da menina e da resposta digna da ministro Dilma Rousseff sobre a tortura. É o que está na pauta.
Mas é para a sorte dos aposentados e pensionistas que pende meu dever de ofício. Se não fosse pela iminência de mais um “estouro da boiada”, a declaração de insolvência do Fundo de Pensão dos Portuários, tocou-me profundamente a carta de uma aposentada, que é o retrato deste país de barbaridades contra os mais velhos e mais indefesos.
Um relato comovente
Veja seu relato:
“Obrigada pelas suas palavras na luta pelos direitos dos aposentados. Sou uma das vítimas desse descaso, fiz a minha parte, como trabalhadora contribuindo durante 29 anos para a Previdência sempre sobre dez salários, apesar da minha deficiência física, pois sou portadora de atrofia muscular progressiva.
Fui aposentada por Invalidez há três anos por ocasião da falência da VARIG. Trabalhei com os comissários e pilotos da VARIG, venci os obstáculos que a doença me impôs, mas agora dependo do governo para me garantir o mínimo de dignidade, pois em três anos minha aposentadoria já desvalorizou a tal ponto que em breve não poderei mais pagar meu plano de saúde, medicamentos, etc. para minha sobrevivência.
Sei que assim como eu milhares de aposentados estão perdendo tudo que no decorrer de suas vidas lutaram para conquistar. Posso citar como exemplo os trabalhadores da VARIG que além de terem contribuído para a Previdência Social sempre sobre 20 salários depois 17 salários e depois sobre dez salários ainda fizeram um Plano de Previdência Privada, o AERUS e para quê?
O Fundo de Pensão desses trabalhadores era um dos maiores fundos do país e por irresponsabilidade da SPC, tudo foi por água abaixo. Muitos deles estão em situação muito delicada, pois já não podem mais pagar seus planos de saúde, medicamentos de alto custo, estão vendendo suas casa, indo morar no interior porque já não conseguem se sustentar”.
“Sr. Porfírio. Quando leio o Estatuto do Idoso fico até revoltada, pois tudo que ali está não é respeitado. Vivemos em um país onde hoje a política só tem olhares para a classe mais privilegiada ou para a classe miserável.
Quanto aos trabalhadores da classe média estão quase todos fadados a perder tudo que ao longo de suas vidas suaram para conquistar.. Ah ...os aposentados, esses pobres coitados precisam com essa política do Governo, morrer mais rápido possível pois já são a maioria nesse país. Onde vamos parar pensando assim?
Não sou contra a política de ajudar os mais necessitados, mas sou contra esse paternalismo barato do governo que não tira o cidadão da miséria, mas alimenta seu comodismo e com isso aumenta sua pesquisa de aceitação que hoje está lá pelos 60%. Que mentira.....
Os aposentados devem sim não só invadir as ruas de todo o país, mas invadir as consciências de todo o povo brasileiro para votar em um governo mais sério que coloca na cadeia os que roubam o dinheiro público , fazendo -os devolver aos cofres públicos tudo que roubaram.
A Previdência Social tem sido vítima de vários rombos e onde estão seus ladrões??? e o dinheiro que levaram onde está? Ninguém sabe, ninguém viu. Se os aposentados forem invadir as ruas, quero sair na ala de frente gritando DIGNIDADE E JUSTÇA, COMODISMO NÃO. Conte comigo nesse grito, nessa luta”.
Não pretendo comandar passeatas, mas acredito que posso fazer A MINHA PARTE, abrindo todos os espaços de que disponho para que possamos juntos unir o máximo de ameaçados de morte “social”, eis que todos estão condenados ao empobrecimento provocado por aposentadorias calculadas para baixo, que a cada ano diminuem ainda mais, na projeção de um campo de concentração de nivelados pelo salário mínimo, independente do que contribuíram.
Portus, a próxima vítima
Os aposentados e pensionistas estão sendo surrupiados por todos os lados, seja pelos cálculos na hora de ir pra casa, seja pela desproporção nos reajustes, seja pela falácia dos fundos complementares, cujas fortunas só foram realmente úteis para facilitar as privatizações-doações da farra do professor renegado.
Depois do virtual fechamento do Aerus, está prevista para os próximos dias a declaração de insolvência do Portus, o fundo dos trabalhadores nos portos, cujos patrocinadores são companhias estatais (docas), que deixaram de recolher R$ 1 bilhão e meio, em prejuízo de 13 mil participantes, num universo de 40 mil dependentes.
A crise desse fundo já se arrasta por uma década, como relatou, dia 6, em audiência na Comissão de Direitos Humanos do Senado, Vilson Balthar Arsenio, presidente da União Nacional das Entidades Representativas dos Participantes do Portus.
Ele lembrou que os problemas relacionados à dívida do fundo não foram causados pelos trabalhadores, que tiveram descontada em folha a contribuição devida. Para ele, como o Portus é patrocinado por diversas companhias docas, que são instituições estatais, o governo tem de responder pelos prejuízos.
No entanto, ficou claro nessa audiência que no próximo dia 14 a Secretaria de Previdência Complementar do Ministério da Previdência Social, procederá a sua liquidação, deixando os portuários a ver navios.
Essa é a posição do secretário da Previdência Complementar, Ricardo Pena Pinheiro. O que vai acontecer com esses aposentados não é difícil prever. Depois que o governo abandonou os beneficiários do Aerus, apesar de uma super-dívida definida pela Justiça em todas as instâncias – só falta a palavra final do STF – boa coisa não se pode esperar.
Está mais do que clara que a política oficial é deixar a própria sorte a previdência complementar, abrindo espaço para o chamado sistema aberto, integrado por seguradoras e bancos, que estão bombando por conta do esvaziamento da previdência pública e da inviabilização, a médio prazo, dos fundos patrocinados, numa espécie de imolação dos que viverem além de certa idade.
coluna@pedroporfirio.com

Aposentadoria de cartas marcadas


Um protesto diferente

No início de dezembro do ano passado, seis aposentados da Petrobras tiraram a roupa na Praça dos Três Poderes, em frente ao Palácio do Planalto, para exigir isonomia salarial em relação ao pessoal da ativa. Um grupo total de 50 pessoas, a maioria do Rio, foi a Brasília mostrar que a situação dos cerca de 60 mil aposentados e pensionistas do setor só piorou nos últimos anos.

MINHA COLUNA NO JORNAL POVO DO RIO DE 9 DE MAIO DE 2008

Não tenho a menor dúvida: a espoliação dos aposentados e pensionistas ainda vai explodir. Pode até ser que a mobilização em si tenha poucas chances de influir, porque quem está à margem do trabalho não tem poder de fogo em relação de algumas categorias pequenas, porém estratégicas e aguerridas.
Mas é tal a calamidade que se abate sobre milhões de brasileiros, é tão nebulosa e expectativa de outros milhões, é tão flagrante a injustiça, a consagração de privilégios, a ostentação de mordomias de uma minoria, que começo a acreditar na capacidade de indignação dos que estão sendo tratados como seres descartáveis.
Como disse antes, o projeto do senador Paulo Paim que acaba com a aritmética perversa do “fator previdenciário” e assegura aumentos iguais para todos dependentes da Previdência ainda é muito pouco.
Primeiro, porque não há maior crime do que condenar aposentados e pensionistas a receberem menos do que teriam direito em função do que contribuíram.
Segundo porque é uma mentira das grossas dizer que não há dinheiro para pagá-los, mentira que só vira “verdade” porque ninguém na mídia ou nas áreas de formação de opinião quer ter o trabalho de fazer as contas.
Isso sem falar de um lobby da pesada, que já teve prepostos dentro do próprio Palácio do Planalto, para favorecer aos planos privados de saúde. Graças à pressão que atinge principalmente a classe média, esses planos devem faturar este ano mais de R$ 32 bilhões, o dobro de 2005.
Para isso, eles contam com o desvio de dinheiro público: quando você declara o imposto de renda e tem a pagar, pode abater até 12% dessa dívida, desde que faça aplicações no sistema de aposentadoria privada.
Isso está criando uma situação insustentável. Tenho recebido relatos contundentes de aposentados, alguns, como no caso dos que contribuíram também para o fundo de pensão Aerus, da Varig e Transbrasil, estão sendo duplamente atingidos.
Já em 2003, eu escrevia a respeito da articulação patrocinada pelo governo Lula, que deu na segunda “reforma da previdência”:
“Gostaria de fazer uma pergunta inocente: se a previdência é tão onerosa, por que os bancos estão trabalhando para tomá-la do Poder Público? Por que os planos privados tiveram um crescimento de 1 para 8 bilhões de faturamento em 2002?” (Coluna da TRIBUNA de 24.02.03).
No final de 2003, o JORNAL DO BRASIL noticiava: “O medo dos efeitos da reforma previdenciária fez o segmento de aposentadoria complementar obter, em 2003, o melhor desempenho dos últimos oito anos. As entidades de previdência privada venderam mais de 1 milhão de planos no ano passado, ampliando seu faturamento em 53,56%, para R$ 14,869 bilhões, segundo dados da Associação Nacional da Previdência Privada (Anapp)".
uma idéia, só em 2003, a captação foi 60% maior do que em 2002 - comemora Osvaldo Nascimento, presidente da Anapp e diretor-executivo da Itaú Vida e Previdência”.
Essa é a verdadeira razão do esmagamento dos aposentados e pensionistas. Voltarei ao assunto.
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quarta-feira, 7 de maio de 2008

Uma maquininha e duas medidas

MINHA COLUNA NO JORNAL POVO DO RIO DE 7 DE MAIO DE 2008
Os aposentados são milhões, mas parecem acomodados, impotentes. E por isso, pode escapar-lhes a possibilidade de reconquistarem melhores dias, embora ainda não seja o que merecem.
Sem fazer as contas, o presidente Luiz Inácio, aquele que emergiu na luta dos trabalhadores, já avisou que vai vetar o projeto do senador Paulo Paim, que acaba com a aritmética perversa batizada de “fator previdenciário” – o tal cálculo que nos faz receber sempre menos do que teríamos direito na hora de aposentar.
E vai mais longe: não permitirá que os aumentos dos aposentados e pensionistas de quem ganhe mais do que o mínimo sejam os mesmos deste. Ele, que hoje está com a vida ganha para filhos, netos e bisnetos, vai acabar conseguindo que todos os aposentados e pensionistas sejam nivelados por baixo, ganhando o salário mínimo, embora tenham descontos diferentes quando trabalham.
Ao mesmo tempo, negocia uma presentão para os donos das terras, que produzem para vender lá fora, onde ganham mais. Lula diz que não há dinheiro para os velhos, quando estes mais precisam. Todos dizem o mesmo, quando estão por cima da carne seca.
Mas para os grandes fazendeiros, não tem porém. No momento, o pequeno grupo de grandes produtores rurais está usando de todos os seus poderes de pressão para não pagar agora suas dívidas com o Banco do Brasil e com o governo, sem, com isso, cair na lista suja do SPC ou do SERASA.
A dívida desses milionários chega a 90 bilhões de reais. Ou seja, seis vezes mais do que o governo gasta com as esmolas do bolsa-família, que forram o estômago e calam a boca de 40 milhões de brasileiros.
Com uma numerosa bancada de deputados e senadores, os donos da terra estão ganhando a queda-de-braço. Querem empurrar com a barriga essa dívida já vencida e ainda exigem um descontão.
Olha só o caô dessa gente fina: como o dólar caiu, porque vai mal das pernas no mundo inteiro, exigem que o governo abata da dívida essa queda. Para você entender: quando pegaram a grana, o dólar custava quase 4 reais. Agora, está a 1,60 e ainda pode cair mais.
Entendeu, eles querem pagar a perder de vista menos da metade do que devem. E se fosse o contrário? É um prejuízo de 50 bilhões de reais, isto é, dez vezes mais do que o alegado acréscimo de 4 bilhões e meio nas contas da previdência com o restabelecimento dos critérios justos para atualização das aposentadorias e pensões.
Para manter os inativos e pensionistas no pior miserê, sem dinheiro para cuidar sequer de sua saúde, o governo do ex-metalúrgico tem um cálculo; para facilitar os lados dos donos das terras, como o governador do Mato Grosso, Blairo Maggi, um dos grandes exportadores de soja, proprietário de latifúndios maiores do que alguns países europeus, a maquininha funciona de um jeito.
Para restabelecer um direito líquido e certo dos aposentados, essa mesma maquininha trava e só consegue fazer a operação de subtração. Até quando, isso eu quero saber também.
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segunda-feira, 5 de maio de 2008

No jogo das aparências, ninguém fala das imposições do agronegócio

Bancada ruralista: ou dá ou desce
MINHA COLUNA NA TRIBUNA DA IMPRENSA DE 5 DE MAIO DE 2008

"A sabedoria não nos é dada. É preciso descobri-la por nós mesmos, depois de uma viagem que ninguém nos pode poupar ou fazer por nós."
Marcel Proust (escritor francês – 1871-1922)
Disse-o muito bem o arguto político mineiro: o que importa é a versão e não o fato. A essa obra prima da sabedoria política, cumpre-me acrescentar: a couraça das aparências dominou geral. Deduz-se, portanto: assim é, se lhe parece.
Esquadrinhe a vida, o seu cotidiano e eleve seu olhar para além das montanhas alterosas e você sofrerá um choque depressivo. Isto se também já não tiver se convertido de um personagem de si mesmo, hábito em uso desde priscas eras.
Tudo o posto é um abominável surto de quimeras induzidas. Somos incitados a contar com bonanças deste e do outro mundo. É um jogo em que uma meia dúzia dá as cartas. E ainda estoca algumas nas mangas. Os outros entram de gaiatos, crentes que abafam. Uma pena!
Manipulando o raciocínio
Viu o que fizeram do ídolo? Deram-lhe corda para enforcar-se. Assim caminha a humanidade. Você está sujeito a pegar o bonde andando e a descarregar sua verve em cima dos alvos predeterminados por eles, os da meia dúzia referida.
A ciência do poder montou uma sofisticada engrenagem com tudo o que eles têm direito. Espertos mais da conta, cuidaram dos mínimos detalhes. Um logro da pesada.
Entre nós, conseguiram o que queriam e o que não queriam. Dar mais do desejado é da nossa natureza latina, cristã, dessa preguiça mental que prefere entregar os pontos a queimar a mufa. Uma lástima.
Fale do que falar, sem notar, você acaba falando o programado por eles. E do jeito que lhes apraz. Você não é uma metamorfose ambulante. Ainda bem. Em compensação é vulnerável, dotado de boa fé e de crenças atávicas, enraizadas. Um descuidado.
Então temos a espécie humana e dentro dessa espécie humana a incidência de poderes sobrepostos sobre nossa compreensão mais elementar.
Segundo a cartilha do núcleo central do pensamento dominante, você não pode ir além de um certo limite na busca da verdade. Todos nós, aliás, estamos sujeitos a tais constrangimentos. Eu também.
Eu iria mais longe. Percebo que querem fazer de você a grande vítima da informação ilusória e direcionada que espargem, jogando, inclusive, com décadas – e séculos – de versões ao gosto dos vencedores, e, no nosso caso, os vencedores seguramente não somos nós.
Eu sei e você sabe que o produto das aparências não tem nada com a realidade. Antes, pelo contrário. Mas quantos podem acordar para as ciladas montadas com o melhor da tecnologia do pensamento? Quantos?
Temos um país cada dia mais distante de si. Eu vejo e você vê. A influência dos centros do pensamento permite que cada um saque esse distanciamento. Mas inocula, junto, uma reação a seu gosto. Eis a questão.
Alimentos escassos
Está claro que, mais dia, menos dia, vamos ter problemas com a alimentação. A essa altura, nada é mais trágico do que saber do renascimento do poder feudal. Isso mesmo. Por tais descaminhos percorridos, agora estamos na mão de um grupelho de donos da terra.
São os grandes vigaristas que se vestem de toda pompa em nome do agronegócio, uma mescla inflamada da atávica ausência de compromissos sociais com a novíssima descoberta da especulação financeira, como o melhor das paradas de sucesso.
Consumimos 10 milhões de toneladas de trigo. Poderíamos produzi-las. Mas não passamos de 3 milhões. Porque o agronegócio está de olho na soja, que virou um negócio da China. Ainda hoje, vale aquele escrito dos idos de setenta: exportar é o que importa.
Os batutas do agronegócio mandam e desmandam. Devem 90 bilhões ao Banco do Brasil, mas já está na agulha um acordo de repactuação dessa dívida.
Donos de muitas cadeiras no Congresso Nacional, eles não querem apenas o refinanciamento. Querem dar meio calote. Como? Exigem que o governo desconte do que devem a queda do dólar. Como se tivessem tomado dinheiro na moeda norte-americana.
Você não tem idéia do que sejam 90 bilhões. Mas é o equivalente do orçamento de dez anos da Prefeitura do Rio de Janeiro. De 90 anos do orçamento da Prefeitura de Natal. Para chegar mais perto, esse dinheiro corresponde a seis vezes o que é gasto com o programa bolsa-família, que alcança 11 milhões de famílias.
Mas muitos de vocês, que talvez não saibam de nada disso, concentram sua indignação nos movimentos sociais como o MST, que a mídia já criminalizou, como se suas ações fossem causas – quando na verdade são conseqüências de uma combinação de promessas congeladas, concessões exageradas, omissões e falta de decisão de governos que descobriram a pólvora na distribuição de esmolas aos que precisam de terras, ferramentas e oportunidades de trabalho.
Qualquer governo sério priorizaria a questão da terra, com uma reforma agrária inteligente, que criasse as condições para a fixação e a volta do homem ao campo, ao mesmo tempo em que estimulasse a produção de alimentos.
O governo do sr. Luiz Inácio e dos falsos profetas não quer nem saber de encarar os senhores da terra, que só falam em “comoddites”, da especulação no tal mercado futuro, um jogo pelo qual a conta acaba sobrando para quem não tem nada a ver com o peixe.
Pudera. O governo da presidente Cristina Kristncher passou o maior perrengue porque quis enfrentar o agronegócio da Argentina, taxando as exportações para garantir o abastecimento do mercado interno. Interditaram rodovias, paralisaram tudo, promoveram o desabastecimento, e contou com o apoio de toda a mídia, parte da qual, aliás, é propriedade dos que podem promover a desordem, porque fazem parte da elite, que tem o monopólio do Estado e da economia de qualquer país.
Aí é que eu digo. É difícil reconhecer autoridade moral em quem desanca o MST e cala para os abusos dos grandes do agronegócio. Estes podem sonegar, ficar com o nosso dinheiro, direcionar seu plantio de costas para as necessidades reais do país. É como se gozassem de um certo tipo de imunidade, alimentada até por quem vai ficar na prejuízo, mas que, por “solidariedade de classe”, cala e consente.
Já os famélicos, os que só querem um pedaço de terra para prover seu ganha-pão, esses são tratados como marginais, baderneiros, inimigos da lei e da ordem.
Enquanto for assim que a banda toca, contemplaremos uma dramática comédia de equívocos, em que os formadores de opinião e os próprios cidadãos voltarão suas baterias para os alvos que eles, os donos do mundo, determinam.
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