quarta-feira, 23 de maio de 2007

UMA CIDADE PRA LÁ DE BAGDÁ

Pra isto aqui virar Iraque só falta homem-bomba. Porque de resto esta cidade abençoada pelo Cristo Redentor, nosso candidato a Cristo Maravilha, já está pra lá de Bagdá.
Mas fala baixo. Pode alguém do morro achar um desesperado sem emprego, sem casa, sem comida e sem roupa lavada que se preste a ser o nosso dinamite.
Se você pensa outra coisa, o que leva um garoto das arábias a carregar uma bomba no próprio corpo é a falta absoluta de condições de sobrevivência digna. Digo isso porque estive lá. E por nossas favelas o que não falta é rapaz sem saber o que será do amanhã.
Aqui, a guerra é diferente. Não é uma guerra santa e nem tampouco houve desembarque de tropas estrangeiras afiadas até os dentes.
Aqui, informe-se aos incautos, a maior assassina é a bala perdida. Sobram armas e munições de parte a parte. E falta pontaria.
É como se fôssemos alvos do fogo amigo. Não há uma área protegida, não há espaço seguro em lugar nenhum. A polícia está dando prioridade à guerrilha nos morros, mas no asfalto também estamos expostos às balas da vez.
O Rio está tão conflagrado que acaba de registrar o primeiro caso de granada perdida. Foi no Morro do Juramento. Como não podia deixar de ser, a granada explode sempre do lado mais fraco. O petardo destelhou um barraco na Rua Tupiniquins e atingiu uma criança de dois anos e seus pais. Todos estão à morte.
Seguindo sua própria bússola, quase na mesma hora, a polícia matou dois caras no Morro do Urubu, a uns 10 kms de distância, e foi logo dizendo que eles eram os donos da granada perdida.
A polícia, aliás, pode se orgulhar de novos recordes no “pan” da morte. Nunca se matou tanto como nesses últimos três meses. Nem no tempo da gratificação faroeste.
Os números oficiais do Instituto de Segurança Pública que não me deixam mentir. E nem por isso, as modalidades de crimes caíram. Pelo contrário, segundo a mesma fonte, das 20 modalidades do catálogo, 16 aumentaram em relação aos meses anteriores.
A grande novidade é a coleção de balas perdidas: numa única batalha, a da Vila Cruzeiro e seus vizinhos do Complexo do Alemão, as balas perdidas fizeram meia centena de vítimas em 20 dias. Número igual ao dos mortos, com ampla vantagem para as tropas policiais.
coluna@pedroporfirio.com

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