domingo, 1 de junho de 2008

"Milicianos", os novos intocáveis

Na prática, as milícias são consentidas e agem de comum acordo com boa parte polícia, até porque muitas delas são formadas por policiais.
MINHA COLUNA NO JORNAL POVO DO RIO DE 2 DE JUNHO DE 2008
Esse episódio de tortura de repórteres do jornal O DIA nas mãos de policiais que agem ostensivamente na ilegalidade não me surpreende nem um pouco.
Aconteceu no dia 14 de maio, mas só ontem o veio a público, neste fim-de-semana, decorridos 15 dias das sevícias sem que se saiba da punição de quem quer que seja.
Antes, teremos daqui para frente três profissionais traumatizados para o resto da vida e toda uma categoria com medo de trabalhar e escrever a verdade.
Os requintes de perversidade servem como uma advertência ostensiva a tudo e a todos. Quem a psicologia das horas de policiais sem freios sabe que em nenhum momento os torturadores dos jornalistas imaginavam que a proeza fosse abafada.
A intenção dos “milicianos” era exatamente realizar uma ação de propaganda, no sentindo de intimidar e mostrar que têm costas largas.
Já estão habituados a mandar para a vala ou para a laje os que se recusam a meter a mão no bolso, mesmo que não tenham um tostão. O próprio jornal O DIA relatou um caso numa comunidade da Taquara, em Jacarepaguá, em que os moradores eram obrigados a abrir a geladeira para pagar a conta dos “milicianos” com seus alimentos.
Quando eu digo que não me surpreende é porque todo o aparato de governo no Estado do Rio de Janeiro dá ampla cobertura a conhecidos facínoras, que exercem uma tirania muito mais radical do que os próprios traficantes.
Nesse aspecto, nenhuma dessas autoridades aí tem moral para dizer qualquer coisa de tais personagens, alguns dos quais, com vida pregressa conhecida, têm acesso a seus gabinetes.
Essas autoridades preferem tirar proveito do poder tirânico exercido por esses verdugos com os quais fazem acordos políticos abertos.
Um delegado de polícia que faz o gênero do grande xerife foi candidato a deputado estadual em 2006 e fez dobradinha com um desses chefes na maior sem cerimônia.
Para agravar, não me surpreende, igualmente, quando uma novela de televisão de grande audiência transforma o personagem de um “justiceiro” desses em verdadeiro mocinho. Você também deve ter visto a institucionalização midiática de um miliciano, aliás, caricaturado num péssimo desempenho por um dos melhores atores brasileiros.
Eu que eu vou dizer aqui, você não vai acreditar: qualquer um pode fazer campanha política na Jacarezinho, onde o tráfico é forte, Mas ninguém pode entrar nas quase oitenta áreas cujo controle foi terceirizado às “milícias” por uma polícia cúmplice, de cujas fileiras saem os cabeças desses supostos mantenedores da ordem com as próprias mãos.
O caso do poderio desses grupos paralelos, com o tácito assentimento do governador Sérgio Cabral Filho é o corpo de delito de um estado de ilegalidade que torna a vida dos pobres um trágico dilema: ou convive calada com os vendedores de maconha, que nada lhes cobra mas exige o silêncio, ou morrem nuns bons trocados nas mãos desses milicianos.
coluna@pedroporfirio.com

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