quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Lupi na mira dos que odiavam Brizola

O ministro Carlos Lupi agiu com competência e tranqüilidade ao suspender quatro convênios questionados destinados à qualificação profissional e ao responder com firmeza à campanha orquestrada para derrubá-lo do Ministério do Trabalho:
— Estou sendo odiado por herança. Todos que odiavam Getúlio e Brizola vão odiar quem se sentar nesta cadeira – disse com todas as letras sobre o cargo que ocupa e a que vem emprestando uma dedicação de causar inveja a “gregos e troianos”.
Ele não disse mais do que o óbvio. Nada assusta mais às elites do que um brizolista à frente do Ministério do Trabalho. Ao ser convidado para participar da coalizão governamental, o PDT deixou muito claro que considera intocáveis os direitos trabalhistas produzidos desde o governo do presidente Vargas.
Essa atitude frustra aqueles que não conseguem raciocinar senão a partir do lucro fácil e da injustiça social, em função de que o Brasil registra diferenças de mais de 1700% entre a maior e a menor remuneração da mão de obra.
Depois de insistirem na lengalenga de que ele teria que deixar a presidência do PDT ou o Ministério do Trabalho, exigência que só se faz agora, porque nunca disse se falou antes, os interesses que patrocinam a campanha contra ele tratam de traumatizar o seu programa prioritário, o da qualificação profissional, providência urgente e elementar, considerando que enquanto ainda registramos altas taxas de desemprego, há milhares de vagas não preenchidas por falta de mão de obra especializada.
Nessa matéria, seus adversários também vão dar com os burros n’água. Durante a sua entrevista, ele demonstrou com números e documentos que os convênios são assinados sem qualquer discriminação política. Quem tiver dúvida, é só considerar a destinação de recursos em aos governos locais.
Para desmentir as acusações de que, desde que assumiu a pasta, em abril, teria privilegiado solicitações de verbas para prefeituras ou entidades ligadas ao PDT, o ministro do Trabalho relacionou um total de R$ 430 milhões em convênios assinados ou renovados ao longo de 2007 e até fevereiro de 2008 e o distribuiu por partidos, considerando o governo de cada estado ou município beneficiado.
Segundo a lista, ao PDT foram destinados R$ 14,4 milhões. Para o PT, foram R$ 96,3 milhões. Os partidos de oposição ao governo também foram destacados. Para o DEM, aparecem R$ 54,1 milhões e, para o PSDB, R$ 102,4 milhões. "Eu não veto nem discrimino ninguém, até porque a norma técnica impede o direcionamento por partido".
O problema, como ele mesmo disse, é que essas elites não engolem um trabalhista no Ministério do Trabalho.
coluna@pedroporfirio.com


Obama está mostrando o caminho: sim, nós podemos!


"Nossa hora está chegando. Nosso movimento é real e a mudança está chegando para a América. Nós somos aqueles que estivemos esperando. Nós somos a mudança que queremos para os Estados Unidos. Nós somos a esperança. Sim, nós podemos!”

Barack Obama, pré-candidato do Partido Democrata, falando em Chicago.

Independente do desfecho da campanha presidencial nos Estados Unidos,ficaremos devendo ao jovem senador Barack Hussein Obama um dos momentos mais edificantes da história política da Humanidade.
Negro e filho de um queniano muçulmano, 46 anos, Obama é hoje a grande esperança de que haja uma mudança de verdade na ainda maior potência do mundo. É também a prova de que nem tudo está perdido naquele país, dono da maior economia e do maior orçamento militar do mundo.
O seu desempenho nas primárias internas do Partido Democrata já representa um sinal positivo para um universo que precisa encontrar os caminhos da paz e da justiça, livrando-se de vez, ou por muito tempo, dessa indústria de guerra, que responde por boa parte da crise mundial e não consegue prescindir da fabricação de ameaças e inimigos.
No caso do Partido Democrata, os norte-americanos estão diante de duas autênticas novidades: ou escolhem um afro-descendente, que, além de tudo, fez seus primeiros estudos num país asiático, a Indonésia; ou uma mulher, esposa de um ex-presidente que viveu um período de oito anos sem guerras e invasões.
Com o pé atrás
Quando seu nome começou a aparecer, fiquei com o pé atrás. Afinal, outro senador negro, o reverendo Jesse Jackson, uma espécie de descobridor da vocação política de Obama, já havia perdido em duas tentativas semelhantes dentro do mesmo Partido Democrata.
E mais: ainda não estão cicatrizadas as feridas de um racismo explícito que predominou nos Estados Unidos, especialmente no Sul, por séculos. Junto a isso, a ascendência de Obama seria usada fatalmente contra ele, na medida em que o atual “grande inimigo” dos norte-americanos é o mundo muçulmano. Mas, incrivelmente, apesar do jogo baixo dos seus adversários, sua mensagem rica em imagens humanitárias se converteu num novo fenômeno para aquele país, com inevitáveis repercussões por todo o mundo.
O furacão Obama resulta de outro fato novo e altamente positivo, como observou o jornalista Jorge A. Bañales,de Washington: “A resposta pode estar nos potenciais 44 milhões de eleitores com menos de 30 anos que comparecerão às urnas este ano, muitos deles motivados pela mensagem de "mudança".
Em uma correspondência da agência EFE , Bañales identifica na mensagem do senador negro a motivação dos jovens, que podem representar 25% dos eleitores presidenciais em novembro.
"Os eleitores jovens vêm participando em proporção crescente desde 2004, mas isso é muito mais notável este ano", disse à Agência Efe, Chrissy Faessen, do grupo Rock the Vote, que se propôs a cadastrar dois milhões de novos eleitores. "Os jovens estão muito ativos e interessados".
No dia 4 de novembro, algo em torno de 130 milhões e 135 milhões de americanos vão votar nas eleições presidenciais, e, segundo o pesquisador John Zogby, 20% deles serão eleitores com menos de 30 anos.
"Se o índice de comparecimento dos jovens à votação continuar o mesmo das primárias, que atualmente está em 60%, estamos falando de 26 milhões a 28 milhões de pessoas", disse Zogby, que afirmou que se Obama for o candidato democrata, o voto jovem poderia chegar até 25% do total”.
Ainda é cedo para fazer prognósticos sobre essa nova “febre”, que está fazendo ressuscitar a esperança e o senso crítico da massa média norte-americana. Porque os laboratórios da intolerância não vão aceitar alguém que de cara acusa Bush de ter cometido um erro fatal, ao envolver-se na invasão do Iraque, contra a qual tem posição frontalmente contrária.
A intolerância conspira
Jack Wheeler, que monitorou Ronald Reagan na década de 80, já começou a trabalhar as paranóias dos seus compatriotas. Ele , é presidente-fundador da Freedom Research Foundation, associação que serviu de cobertura à CIA para recrutar mercenários e apoiar guerrilhas anti-comunistas, nos anos 80. Wheeler, que colabora desde há muito com o grupo Moon, ministrou cursos de tortura para militares latino-americanos na School of Americas de Fort Benning, Geórgia.
Em artigo publicado no “Washington Times”, ele escreveu: “Barack é o produto de um muçulmano negro do Kenia, Barack Hussein Obama, e uma ateísta branca do Kansas, Shirley Ann Dunham, que se conheceram na Universidade do Havaí em Honolulu. Por isto seu segundo nome é o mesmo de Saddam. Seu primeiro nome é de origem islâmica, derivado da palavra árabe baraka utilizada no Corão para ABENÇOADO”.
Seu artigo foi reproduzido por grande rede de blogueiros de extrema direita nos EUA com o apoio da rede de televisão FOX. Resultado: embora Obama seja protestante, freqüentador assíduo de um templo evangélico, uma recente pesquisa feita nos Estados Unidos, informou que 50% dos entrevistados acreditam que ele é muçulmano.
Também em relação a esse tipo de queimação, que inclui chamá-lo de Osama (referência Bin Laden) , o carismático líder também não ficou na defensiva - outra lição que deu ao mundo. Para ele, o fato de ter vivido alguns anos de sua infância em um país muçulmano permite abrir caminho para um diálogo com essa população de mais de um bilhão de habitantes.
“Depois de ser eleito, desejo organizar uma reunião de cúpula no mundo islâmico, com todos os chefes de Estado, a fim de ter uma discussão franca sobre como superar a distância, maior todos os dias, entre os muçulmanos e o Ocidente. Quero pedir-lhes que participem na nossa luta contra o terrorismo. E precisamos também ouvir as queixas deles”, declarou à revista francesa PARIS MATCH.
No primeiro grande evento que o projeto nacionalmente nos EUA, a convenção do Partido Democrata de 2004, Obama definiu com firmeza como vê o seu país: “Não há uma América liberal e uma outra conservadora; há apenas os Estados Unidos da América. Não há uma América negra, uma América branca e outra América asiática, há apenas os Estados Unidos da América”.
Assim, Barack Hussein Obama vai conquistando os corações e mentes dos norte-americanos. Tomara que não seja mais uma vítima de balas assassinas, nem de baixarias covardes.
coluna@pedroporfirio.com

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

PORQUE HOJE É DIA DE SÃO PORFÍRIO


COLUNA NO JORNAL POVO DO DIA 27.2.2008


Pelo carinho de dois parceiros da Internet , E Benz, aeronauta aposentado do Rio Grande do Sul, e Waldo Luiz, meu ex-colega na Bloch,aqui do Rio, fiquei sabendo que ontem foi o dia de São Porfírio.
Os dois, que tiveram a mesmo iniciativa e enviaram a mesma informação, provavelmente, não se conhecem. Mas veja quem foi, em síntese, São Porfírio, bispo de Gaza, aquela área tão sofrida onde palestinos sobrevivem a duras penas:
“ (+ Palestina, 420) Natural da Macedônia, distribuiu aos pobres toda a sua fortuna e passou a viver na Terra Santa, como eremita, às margens do Rio Jordão. Foi mais tarde ordenado sacerdote e escolhido para bispo de Gaza, na Palestina. Depois de muito ter insistido, conseguiu obter do Imperador um decreto mandando fechar todos os templos pagãos de Gaza, e reduzir a cinzas todos os ídolos de sua diocese. Faleceu muito idoso, sempre no exercício zeloso de suas funções pastorais”.
Porfírio, na verdade, é meu sobrenome de família, lá do Ceará. Meu nome é Pedro, mas todo mundo, inclusive minha mulher, só me chama pelo sobrenome, assim como acontece com o meu filho mais velho, jornalista em Brasília, que, embora tenha sido batizado em 1965 como Vladimir, também só é conhecido como Porfírio.
Tomei-se de atenção pelas mensagens e por quatro informações contidas naquela síntese:
1. Distribuiu aos pobres toda a sua fortuna e passou a viver na Terra Santa, como eremita, às margens do Rio Jordão. A generosidade é a maior das virtudes e faz o ser humano que a pratica ser feliz de verdade. Infelizmente, em nossos dias, o que vemos é o contrário.
2. Foi bispo de Gaza. Pelo que pesquisei depois, ele atendeu a um apelo de outros sacerdotes, naquele início do quinto século da era cristã, porque ali os ricos e poderosos mantinham agressivos cultos pagãos. Só ter vivido entre os palestinos me faz arrepiar. Tenho uma grande identidade com o sofrimento desse povo milenar e estive por lá em 2002, juntamente com o vereador Rubens Andrade, na tentativa de levar a Medalha Pedro Ernesto para Yasser Arafat, então “prisioneiro” das tropas de ocupação de Israel. Não consegui entrar em Ramalah, nem conhecer a faixa de Gaza. Mas foi emocionante ir Jerusalém, conhecer o túmulo de Jesus Cristo e contemplar Jericó terra de 10 mil anos de existência, como havia feito também em Damasco, Síria, cidade da mesma época.
3. Faleceu muito idoso. Considerando a idade média daquela época. Estou concluindo que também completarei meu século, como os admiráveis Barbosa Lima Sobrinho e Oscar Niemeyer.
4. Nasceu na Macedônia, terra do mais importante dos imperadores da antiguidade, Alexandre, o Grande, aluno de Aristóteles e mensageiro da civilização helênica.
Ser Porfírio, portanto, dá gosto, pelo santo e pelo povo a que se dedicou.
coluna@pedroporfirio.com

domingo, 24 de fevereiro de 2008

Pior que a Lei de Imprensa é o filão dos “danos morais”

MINHA COLUNA NA TRIBUNA DA IMPRENSA DE 25 DE FEVEREIRO DE 2008

“O país não pode prescindir de uma Lei de Imprensa, moderna e contemporânea. O exercício do jornalismo não pode estar submetido ao controle do Código Civil.”
Celso Schröder, vice-presidente da Federação Nacional dos Jornalistas.

Desculpe a franqueza, mas este país está cada da vez mais ridículo. Ridículo? Reconheço que estou sendo generoso. Onde campeia a mais exaltada mediocridade, onde os espertos manejam os cordéis de todos esses podres poderes, onde a percepção crítica evapora-se por todos os poros e os cérebros são encadernados por controle remoto em séries numeradas, a astúcia da farsa diversionista contamina muito mais do que aparenta.
Tem sentido essa festa de arromba para mais um ato monocrático e plenipotenciário de um astro do Poder Judiciário, no uso dessa perigosíssima ferramenta chamada LIMINAR, como se com ela estivessem nos livrando de um “entulho autoritário” que sobrevive há 19 anos desde a nova Constituição? É preciso esclarecer:
Primeiro: essa “decisão histórica” chove no molhado, já que a antiga Lei de Imprensa, mesmo mantida após a 1988, perde sua validade nos casos em que conflita com a Lei Maior. Não há, portanto, nenhuma novidade a comemorar.
Segundo: não sendo advogado, ouso dizer que houve mais uma vez a banalização da medida LIMINAR. Não se configuravam as premissas que devem se somar: o “periculum in mora” (perigo da demora) e o “Fumus boni iuris” (fumaça do bom direito).
Terceiro: sem uma Lei de Imprensa, caímos na vala comum do Código Civil, sujeitando-nos ao filão dos “danos morais”, preferido por 9 em cada 10 reclamantes, porque, conforme o parágrafo primeiro do seu artigo 953 “se o ofendido não puder provar prejuízo material, CABERÁ AO JUIZ FIXAR, EQÜITATIVAMENTE, O VALOR DA INDENIZAÇÃO, NA CONFORMIDADE DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO”.
Quarto:
a petição assinada pelo deputado Miro Teixeira em nome do PDT foi uma Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental, mas em caráter genérico, não identificando nenhum direito lesionado. Poderia ser até matéria para o STF, mas sem fugir ao rito processual regular.
O próprio PDT assina uma Ação Direta de Inconstitucionalidade – a ADI 3994 - contra artigos da Lei 11.101/05, que ferrou de cara 9 mil trabalhadores da VARIG, cujos direitos trabalhistas foram solenemente desconhecidos. Na ação de agosto do ano passado, que criou o primeiro grande desconforto para o ministro Carlos Lupi, o PDT também requereu LIMINAR. E até agora, nenhuma fumacinha pintou no horizonte perdido.
Ao contrário: a petição dormita entre as pilhas de processos distribuídos ao ministro Ricardo Lewandowski, desde o dia 2 de agosto de 2007.
De cabeça para baixo

Vamos e venhamos: puseram nossa pátria amada de cabeça para baixo. O Executivo legisla por medidas provisórias, o Judiciário, por liminares, e o medíocre Poder Legislativo simula investigar para ser pautado pela grande mídia.
No caso da medida provisória, embora ela possa ser reeditada muitas vezes, tem prazo para votação no Congresso e ainda tranca sua pauta. Já nas liminares, elas podem durar como se fossem leis: estão aí os escândalos dos bingos, dos combustíveis adulterados e outros mais que não convém falar aqui, agora.
A medida provisória é abominável, mas poderá ser ou não confirmada por outro poder. Já a liminar permite ao magistrado dispensar o contraditório pelo tempo que quiser, desrespeitando o próprio regime interno do seu tribunal. Com o dote da liminar, um desembargador de uma Câmara Civil pode cassar o mandato de um parlamentar e demorar dias,meses e anos a submeter sua decisão ao colegiado, embora esse mandato tenha dia e hora para findar.
Nesse fim de semana, venderam-se delírios no varejo com a história de que finalmente raiou a liberdade de imprensa, a partir da canetada solitária de um prócer do Judiciário. Agora, segundo o canto da sereia, estamos livres dos pescoções da lei. Já podemos escrever sem medo do cerceamento coercitivo.
Quanta mistificação! Se a nova carta já travava os artigos da velha lei agora liminarmente engavetados, qual a eficácia do parto judicial? E o frenesi dos “DANOS MORAIS”, filé mignon no estoque de pleitos de 500 mil advogados, formados em mais de mil faculdades? Quem ousa enfrentá-lo?
Certamente, você não pesquisou o Código Civil e talvez nem tenha tido conhecimento do teor dos artigos expurgados da antiga Lei de Imprensa. Mas se der uma olhadela na parte do Código que se refere às indenizações ( que vai dos artigos 927 a 954), verá que por aí a emenda saiu pior que o soneto.
Não estou aqui para defender a Lei de 1967, mas concordo com Mauro da Silva Porto, que comentou a notícia no espaço de leitores GLOBO ON LINE, observando: na lei questionada “até indenização era tarifada, ou seja, bem melhor, pois estabelecia um limite de condenação”.
Limites pecuniários
É verdade. Enquanto agora estamos sujeitos a cálculos de acordo com a cara do freguês, o artigo 51 da Lei 5.250/67, definia as punições pecuniárias nos mínimos detalhes: a maior punição por responsabilidade civil custava 20 salários mínimos (R$ 7.600,00), quando em “falsa imputação de crime a alguém, ou de imputação de crime verdadeiro, nos casos em que a lei não admite a exceção da verdade (art. 49, § 1º)”.
Hoje, é preciso realmente ter uma Lei de Imprensa que garanta os direitos da sociedade contra os abusos da mídia. Mas essa Lei não pode virar uma metralhadora giratória contra todo o dito e não dito. Mais do que isso, precisa explicitar em seu texto, no que tange a indenizações, a capacidade econômica de cada veículo e a realidade salarial dos profissionais de imprensa. Por ora, a decisão festejada expõe a liberdade de expressão às variáveis do Código Civil, onde os parâmetros do julgador obedecem ao dito popular: cada cabeça uma sentença.
Essa liminar do ministro do STF, que se soma ao grande arsenal que transforma cada magistrado num senhor das leis e do direito, só tem o mérito de reabrir uma discussão que vai e volta, conforme a falta ou excesso de assuntos em pauta, enquanto desde 1991 desfilam pelo Congresso projetos de nova Lei de Imprensa.
Eu, pessoalmente, não tinha medo da velha norma. Mas me sinto totalmente constrangido de falar certas coisas, principalmente em relação a atos no poder judiciário, por causa do caráter subjetivo dos “danos morais”, usados com fartura num mundo jurídico indevassável, intocável, blindado e municiado de liminares para todos os lados, que ninguém pode questionar, sem o risco de ficar no prejuízo ou ir à falência.
coluna@pedroporfirio.com

Liminar contra Lei de imprensa: um tiro no pé

MINHA COLUNA NO JORNAL POVO DO RIO DE 25 DE FEVEREIRO DE 2008

Pois eu não vejo motivo para festejar a decisão liminar do ministro do STF, que suspendeu boa parte da antiga Lei de Imprensa. Nas circunstâncias atuais, ruim com ela, pior sem ela.
Explico: desde 1967, portanto há 40 anos, está em vigor a Lei de Imprensa, assinada ainda pelo general Castelo Branco. É tida como autoritária porque prevê, inclusive, pena de prisão para jornalistas que falarem mais da conta.
Em 1988, a Assembléia Nacional Constituinte aprovou a nova Carta Magna. O natural seria que, imediatamente, esse mesmo Congresso tratasse de atualizar a legislação complementar, até porque, no caso da antiga Lei de Imprensa, vários dos seus artigos passaram a colidir com a Lei maior.
Em 1991, o falecido senador Josaphat Marinho esboçou a primeira proposta de reforma. Desde então, vários projetos desfilam pelas casas legislativas, sem chegarem aos “finalmentes”.
Em 1997, por iniciativa do mesmo senador, um jurista de primeira, o projeto de reforma do Código Civil foi desengavetado, para virar lei em 2002, pouco antes de sua morte.
Antes mesmo disso, as pessoas que se consideravam ofendidas por jornalistas e reportagens preferiam abrir processo pedindo indenizações por danos morais. As possibilidades de ganharem muito mais eram evidentes, na medida que a Lei de imprensa limitava em 20 salários mínimos a maior multa.
Na prática, até por interesse dos “ofendidos”, a velha Lei de Imprensa já estava em desuso.
No entanto, como muitos pastores e fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus resolveram processar órgãos de imprensa em face de matérias que consideravam ofensivas, os jornalistas se consideraram intimidados. Tais processos não foram ajuizados na Lei de Imprensa, mas, pelo que soube, com base no artigo 5º da Constituição, em nome da liberdade religiosa.
No calor dessa polêmica, o deputado Miro Teixeira entrou no STF com mandado de segurança contra a velha Lei e obteve imediatamente uma liminar de um ministro, suspendendo a maior parte dos seus artigos.
A liminar, uma medida por si discutível por seu caráter unilateral, neste caso, “choveu no molhado”. Mas reforçou outra vez a tendência de transferir para o poder judiciário as faculdades legislativas do Congresso, o torna ainda mais inútil aos olhos da população.
Se há 19 anos a nova Lei de Imprensa não sai, derrubar a antiga por liminar é dar um tiro no pé, como veremos. A imprensa vai ficar exposta às avaliações do Código Civil, onde os processos por danos morais têm gerado indenizações milionárias, como os 3 milhões de reais que o SBT terá de pagar ao Centro Naturalista Colina do Sul, no Rio Grande, devido a comentários de mau gosto do seu irreverente Ratinho.
coluna@pedroporfirio.com

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Porque Fidel deixa o poder como um líder invicto


“Fidel Castro não foi ditador e sim um libertador. É o maior líder do seu tempo, se manteve isolado e independente. Mesmo os que o combatem reconhecem que Cuba não é mais a mesma. Exclusivamente pela força, a convicção e a certeza do que pretendia, Cuba deixou de ser a praia de fim de semana de americanos ricos, a jogatina diária desses mesmos estrangeiros que só queriam se divertir: hoje é respeitada, aclamada, invejada”.
Hélio Fernandes, TRIBUNA DA IMPRENSA, 21 de fevereiro de 2008

Depois do que Hélio Fernandes escreveu ontem em sua coluna, cuja maior marca é a independência, não precisaria escrever a respeito do fato internacional mais importante deste verão de 2008. Mas como vi por dentro a revolução cubana praticamente desde o seu nascedouro, ouso chamar todos os meus leitores, inclusive os que odeiam Fidel Castro, a uma reflexão honesta a respeito deste líder que foi a grande referência do Terceiro Mundo neste meio século em que esteve à frente do governo cubano.
Com uma coragem que faz falta aos homens públicos em todo o mundo, Fidel Castro exerceu tal papel na história que sua despedida do poder, aos 81 anos, realmente por razões de saúde, mereceu um caderno especial em O GLOBO e as primeiras páginas nos diários de todos os países, sem falar nos destaques dos tele-jornais.
Raciocinemos juntos, numa boa: por que desse noticiário tão inflado e rico em informações para registrar a formalização de uma situação que já se arrastava por 19 meses? Afinal, Cuba é apenas uma ilha de 11 milhões de habitantes, BLOQUEADA por todos os lados pela maior potência mundial, cujos governos e grupos econômicos recorreram a todas as armas para desconstruir sua revolução.
Vê se eu me fiz entender: você já parou para pensar, independente de suas simpatias e antipatias políticas, sobre esse feito sem precedentes desde que os Estados Unidos da América converteram-se no temido arsenal militar e no maior poderio econômico do mundo?
Até a URSS caiu

Compare comigo: se até a outrora poderosa União Soviética desmoronou ainda na condição de segunda potência mundial, se até a gigantesca China Continental assimilou a economia de mercado para sobreviver e crescer, qual o segredo de Fidel Castro, o romântico de Sierra Maestra, alvo de pelo menos 600 tentativas de homicídio concebidas e patrocinadas pelos órgãos de segurança dos EUA?
O que explica a sobrevivência desse regime revolucionário, senão o amplo apoio popular e o êxito de suas políticas públicas, apesar do castigo quase letal de um embargo econômico impiedoso, em que o governo da grande potência não se limita a suas próprias medidas, mas exige que todos os demais países do mundo mantenham os cubanos a pão e água?
Eu bem sei, porque, como disse nas primeiras linhas, fui lá mais de uma vez, em diferentes momentos de seu processo revolucionário: em julho de 1960, quando ainda tinha 17 anos, estava em Havana participando do I Congresso Latino-Americano de Juventudes, representando a União Brasileira de Estudantes Secundaristas.
No ano seguinte, já como jornalista de carteira assinada na ÚLTIMA HORA, fui trabalhar lá até julho de 1962, e testemunhei momentos de grande mudança. Voltei a Cuba, como turista, em 1986. Finalmente, integrei uma delegação parlamentar brasileira que visitou Havana em julho de 2003.
Poucos brasileiros tiveram tantas oportunidades de conhecer e avaliar, em fases tão distintas, a revolução cubana e a liderança de Fidel Castro, que venceu as mais olímpicas das provas em situações em que ninguém, a não ser os teimosos cubanos, imaginavam que ele e seu regime socialista tivesse condição de superar, como no chamado “período especial”, conseqüência do desmantelamento da União Soviética e dos países do Leste europeu, cujo marco foi a queda do Muro de Berlim, em 9 de novembro de 1989.
Nenhuma criança na rua
Quando você olhar para aquela ilha rebelde, a 110 Km da costa da Flórida, antes de buscar motivos para criminalizá-la na mais bem industriada orquestração regida pela potência que não se conforma em ter perdido a guerra contra Fidel, reflita sobre esta frase que ele pronunciou, durante a visita do Papa João Paulo II a Cuba, naquele janeiro de 1998: "ESTA NOITE MILHÕES DE CRIANÇAS DORMIRÃO NA RUA, MAS NENHUMA DELAS É CUBANA".
No dias de hoje, em que o regime democrático representativo não encara com seriedade os problemas mínimos do povo de onde, segundo a Carta, emana o poder, dedicando-se a programas compensatórios de mendicância oficial, onde a Justiça pode ser sede de um massacre como no caso da VARIG, entregue a preço de banana a aventureiros internacionais, ou mesmo de um ato de arbitrariedade calçado de formalidades processuais – como a absurda apropriação do meu mandato – você faria muito bem a seus filhos e às futuras gerações se procurasse entender, como eu entendi, a natureza do “milagre cubano”, onde já não há analfabetos, todos têm acesso ao melhor ensino público do mundo (segundo a UNESCO) e o nível de escolaridade média da população é de 12 anos, enquanto os índices de saúde são comparáveis aos dos países do primeiro mundo.
Será que você não acha isso relevante? Fidel Castro não ficou por acaso esse tempo todo no poder, asfixiado perversamente pela potência que faz e desfaz governos, que ainda dita as regras do jogo, que acaba de patrocinar mais uma amputação na fatiada Iugoslávia, que tem um orçamento militar de meio trilhão de dólares, mais do dobro de todo o orçamento brasileiro, que tem bases em todos os continentes, o maior arsenal bélico instalado, que promove invasões como a do Iraque hoje ou da pequena Granada ontem, e que banca as tropas brasileiras no Haiti.
Num país em que um em cada 15 habitantes fez uma boa faculdade, em que a UNESCO constata os melhores desempenhos escolares do mundo no primeiro grau, é natural que a população releve o sacrifício imposto pelo boicote e considere emergencialmente inevitável, num estado de guerra permanente, a sobrevivência de um Estado politicamente forte, embora nas eleições para suas casas legislativas (onde os representantes não recebem um centavo pelos mandatos, já que se mantêm em suas atividades laborais), os candidatos saiam de entidades da sociedade e não são obrigatoriamente filiados ao seu partido único.
Como você vê, há muito o que falar sobre Fidel Castro, sem medo e sem rancores, e é possível que eu volte ao assunto, disposto a trocar idéias com você em cima de fatos concretos, que falam mais alto do que qualquer propaganda direcionada.
coluna@pedroporfirio.com

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

ANO 1 Nº 1 ABRIL DE 208

domingo, 17 de fevereiro de 2008

Para que você não pense que estou aceitando tudo calado


MINHA COLUNA NA TRIBUNA DA IMPRENSA DE 18.02.07

“Apesar de ser tolo pensar que o ato de escrever pode por si mesmo provocar uma mudança, não é tolo acreditar no poder da palavra escrita”.
Robert Jensen, professor associado da Escola de Jornalismo da Universidade do Texas

Nesta terça-feira, 19 de fevereiro, dia da segunda e decisiva Batalha dos Guararapes, estaremos lamentando o transcurso do segundo mês desde a mal inspirada liminar de um desembargador, privando-me, pela segunda vez em um ano, do exercício do mandato parlamentar que me foi conferido por 13.924 eleitores da cidade do Rio de Janeiro.
Numa época em que todo político é suspeito até prova em contrário, muitos amigos meus se queixam da dificuldade de explicar o ocorrido, até porque, apesar de tantos desvios de conduta escancarados, os parlamentares cassados não passam de uma meia dúzia de três ou quatro, em todo o país.
Deste cearense que vos fala, graças aos ensinamentos do velho Doca, o pai-avô que perdi aos sete anos, e ao próprio DNA, você jamais verá o modesto nome envolvido com qualquer tipo de trapaça, em qualquer campo de atividade, de onde os danos inerentes à liminar insustentável.
E olha que dentro de um mês estarei completando 65 anos, 50 de atividade pública, uma passagem bisada pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social e a presidência do Conselho de Contribuintes da cidade do Rio de Janeiro.
Por isso, não posso deixar de voltar ao assunto. Não posso sequer me conformar com o óbvio: mais do que eu, “cassado” sem qualquer fundamento jurídico, mais do que meus eleitores, quem se expõe nesse episódio dantesco, quem perde em credibilidade e confiança, é a Justiça que, não obstante tantos magistrados de bem, competentes e honrados, ficará com uma nódoa incrustada na borda de sua simbólica venda.
Quem perderá o sono

Porque, mais dia, menos dia, há de aparecer alguém para contar essa coleção de absurdos, tintim por tintim, tanto quanto hoje, distante três décadas, foi o torturador que me impôs tanto sofrimento naqueles lamentáveis idos quem teve de deixar crescer a barba para fugir de si mesmo, administrando a tortura da história que carregará até o túmulo.
Assim também, como efêmero é o poder, terão noites de insônia e pânico do julgamento de seus filhos e netos, aqueles que não tiverem a prudência devida ao se valerem de faculdades sumárias em decisões que carecem do mínimo de sustentação, por mais permissiva que seja a hermenêutica.
À luz do dia, como já aconteceu no julgamento de mérito proferido por uma juíza competente e corajosa, não há como explicar a invasão de matéria da Justiça Eleitoral para intervir no Poder Legislativo e retirar de cena um parlamentar, acolhendo como única alegação a SUPOSIÇÃO DE UMA RENÚNCIA QUE NÃO HOUVE, até porque, PASMEM, teria acontecido antes mesmo da disputa das eleições de 2004.
Uma “renúncia” tão ESDRUXULA E FANTASIOSA, obtida por ilação, antes da posse e fora do lugar previsto em Lei (a casa legislativa) , como, aliás, com toda a clareza, o Tribunal Regional Eleitoral do Estado do Rio de Janeiro havia definido em janeiro de 2007, apesar do direcionamento capcioso de uma consulta baseada em algo que também não acontecera.
Ao longo dessa novela mal escrita, a sensação que me domina é de que, sobrecarregados por processos de toda natureza, os desembargadores da Justiça Comum podem ser facilmente induzidos a erros por advogados espertos e/ou arrogantes.
Imagino mesmo que nunca sobrou a nenhum dos desembargadores, cujas decisões beneficiaram ao segundo suplente, o tempo suficiente para uma leitura inteira da matéria.
É preciso que você e todos os MAGISTRADOS do Brasil, todos os procuradores do MINISTÉRIO PÚBLICO saibam que EU FUI A ÚNICA VÍTIMA DE UMA AÇÃO DE PERDA DE MANDATO, NA JUSTIÇA COMUM, entre dezenas de políticos do PDT, particularmente do Estado do Rio.
A Lei dos partidos políticos (9096) é de 1995 e regulamentou os artigos 17 e o inciso V do § 3º do art. 14 da Constituição Federal. A Resolução 01/98 do PDT, que definiu o seu conceito particular de fidelidade partidária está em vigor desde 1998.
A sina do patinho feio
Desde então, dezenas de mandatários saíram de sua legenda e, pelo menos aqui no Estado do Rio, o partido jamais pleiteou a cassação dos seus mandatos, nem tampouco o Ministério Público, até porque, antes da decisão do STF de 3 de outubro de 2007, vigia a jurisprudência do próprio Supremo,decorrente do voto do ministro Moreira Alves, de 1989, com o qual aquela corte entendeu que não existia fidelidade partidária.
Para você e TODOS OS MAGISTRADOS DO BRASIL tomarem conhecimento, lembro que o governador Garotinho abandonou o PDT em 2001, levando uma penca de deputados, prefeitos e vereadores, e nem por isso seus mandatos foram sequer ameaçados por ações nesse sentido.
Caso emblemático foi a decisão do deputado Miro Teixeira, que deixou o PDT para continuar no ministério do governo Lula, passou pelo PPS e pelo PT, retornando em 205, sem que sofresse um único arranhão por essas andanças, até porque ele é um dos mais competentes parlamentares brasileiros.
É verdade que em 1 de maio de 2005 me desfiliei do PDT, quando não estava exercendo mandato. Mas também é verdade que voltei ao partido em 2006, antes de assumir na condição de primeiro suplente.
É igualmente verdade que o segundo suplente beneficiado por essas liminares fez o percurso semelhante: saiu do PDT em 2005 para filiar-se ao PHS e voltou no mesmo mês de 2006 em que retornei. Isso consta de todos os processos que tramitam no Tribunal de Justiça do RJ – 20ª Câmara Cível e Órgão Especial – e, no entanto, estranhamente, só eu estou pagando o pato.
É mais verdade ainda, e aí você e os MAGISTRADOS DO BRASIL devem cair de costas, que o suplente beneficiado pela liminar do dia 19 de dezembro, já estava filiado ao PSC desde 28 de agosto de 2007, o que escondeu por um mês, quando manteve dupla filiação, e que saiu do PDT em 28 de setembro de 2007 sem formular uma única queixa. Abriu o jogo ao tomar conhecimento da sentença denegatória da juíza Jacqueline Montenegro, titular da 6ª Vara da Fazenda.
Isto é, em português claro: o cidadão que ocupa minha cadeira está totalmente errado, não poderia se beneficiar de liminar nenhuma, e no entanto, neste país tropical, nesta cidade nervosa, é ele quem ocupa a vaga do PDT em nome do PSC.
O que é que você quer mais? Tramitam simultaneamente três recursos meus e do PDT contra o esbulho de que somos vítimas. Na 20ª CC, no Órgão Especial e no TRE-RJ - neste foro, com base na Resolução 22.610/07 do TSE e da Resolução 680/08 do TRE-RJ.
Está tudo nos conformes e, por isso, só tenho expectativas positivas em relação ao resgate do mandato. No entanto, como este tem dia e hora para findar e já foi amputado duas vezes, totalizando quase três meses, é natural que volte ao ao lamento, pois esta é uma situação emblemática, sobretudo, como já disse, para o regime de direito, pelo qual paguei com o próprio sacrifício da liberdade.
coluna@pedroporfirio.com

Conflito entre OAB e STJ: uma preocupação a mais

MINHA COLUNA NO JORNAL “POVO DO RIO” DE 18.02.2007

Para o cidadão comum, que a qualquer momento, por qualquer motivo, está exposto a às barras da Justiça, não deixa de ser assustador esse conflito explícito entre a OAB e o STJ, algo que denuncia a definitiva compreensão de que o Poder Judiciário vive realmente um ambiente político com reflexos sobre toda a sociedade.
O ápice dessa divergência foi a decisão dos ministros do STJ de negaram quorum para a indicação de três candidatos a magistrados de uma lista de seis, preparada pela OAB nacional. Os três mais votados seriam submetidos ao Presidente da República. O regimento do tribunal prevê, porém, que para ser indicado o aspirante a ministro deve ter pelo menos 17votos, o que pela primeira vez não aconteceu naquela corte de Justiça.
Para que você, que não é do mundo jurídico entenda melhor: O STJ é a instância superior dos processos infra-constitucionais. Só os casos que de alguma forma afetam as garantias da Constituição chegam ao STF.
Ele é formado por um terço de magistrados oriundos dos tribunais regionais federais, um terço de desembargadores oriundos dos tribunais de Justiça e um terço, em partes iguais, alternadamente, de advogados e de membros do Ministério Público Federal, estadual e do Distrito Federal.
A vaga a ser preenchida seria da cota da OAB. No entanto, nas três votações, todos os seis nomes apresentados tiveram poucos sufrágios, enquanto os votos em branco chegaram a somar 19 num dos três escrutínios.
Essa decisão reacendeu antiga discussão sobre os critérios de preenchimento das vagas de ministros e desembargadores do Poder judiciário.
A Associação dos Magistrados é contra essa cota destinada a advogados indicados pela OAB. Considera que todos os acessos devem ser reservados aos juízes de carreira, o que em tese tem uma certa lógica, embora, ao garantir a presença de representantes dos advogados e do ministério público, o presidente Getúlio Vargas tenha se inspirado num conceito plural sobre as instâncias superiores.
Eu acho que estamos diante de uma situação desconfortável. No caso do STJ, há esses critérios. No entanto, nas nomeações dos 11 ministros para o Supremo Tribunal Federal, a mais alta corte do país, não existe nenhum tipo de exigência.
É prerrogativa exclusiva do presidente da República e, podemos dizer que o Supremo jamais se deixou submeter politicamente. Sobre o STF, aliás, caberia uma outra discussão: a população dobrou desde que seus membros são fixados em 11. Há processos que dormitam em suas prateleiras há mais de dez anos. Não seria o caso de uma reavaliação de todo o sistema de formação do nosso judiciário?
I

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Os cartões de uma genética peste corporativa

“Para nós, quanto menor a transparência, maior é o grau de segurança” – general Jorge Felix, chefe de Gabinete da Segurança Institucional da Presidência da República.

Vamos e venhamos: toda essa sucessão de disfunções que inspiram o comportamento dos titulares desses podres poderes tem um conteúdo essencialmente existencial e efeitos colaterais degenerativos, transformando em perigosa rotina um abominável despautério.
Estamos diante de um ambiente semelhante à pequena Sodoma, descrita no livro de Ezequiel como terra da abundância, da insolência e da insensibilidade. A diferença é que aqui não escapa uma viva alma, ninguém que possa se assemelhar à figura bíblica de Ló, sobrinho do patriarca Abraão.
A exposição pictórica do desfrute abusivo das facilidades da casa da mãe Joana não é nem de longe original. Com as alquimias que os discípulos do monge Grigoriy Yefimovich Rasputin engendram a cada cenário, mais do que o Estado como expressão institucional, é o próprio gênero humano desestruturado moralmente que vai sucumbindo nos caminhos ínvios sob incontidos impulsos dos cantos das sereias.
A modernidade, que tantos e belos avanços nos trouxe, respondendo hoje por mais anos de vida no resgate da nossa primeira sina biológica, exagerou na produção inevitável dos seus contrários. Para cada ganho, cada virtude revelada, gera numa terrível contrapartida, uma atmosfera tão poluída que já não se pode contar com o equilíbrio compensatório.
Os genes da safadeza
Antes, como o culto da ambição desmedida e da ignomínia exaltada inoculou no cérebro humano os genes da safadeza, a peste que mina o poder parece uma hidra invencível, reproduzindo sua ideologia hipócrita sobre o conjunto da sociedade humana.
O sentido real da maldição de Sodoma e Gomorra é muito mais do que a primeira leitura dos livros sagrados. Segundo o constante de Gênesis 18:20-33, como o patriarca Abraão intercedia pelo povo do vale do Sidin, na mira do castigo letal, Deus fez um desafio: se houvesse em Sodoma dez pessoas justas, a cidade não seria destruída.
Como a missão de dois anjos disfarçados de forasteiros não conseguiu achar nesse desiderato senão o próprio sobrinho de Abraão, só restou ao criador despejar toda a sua ira, em forma de um implacável fogaréu.
No mundo de hoje e, em particular, nesta terra descoberta por Cabral, vai ser difícil encontrar igual número de recatados. Se estes existem, estão escondidos na penumbra e nos subterrâneos, com medo de lhes cortarem as cabeças, sob o grave anátema de jurássicos subversivos por serem incorruptíveis.
O espetáculo do crescimento dos cartões corporativos, que deixa à mão de insaciáveis cortesãos um cheque em branco, é um corpo de delito imperdoável, mormente quando se sabe que 75% dessa fortuna pública foram sacados à beira do caixa, em dinheiro vivo, sem qualquer explicação. E o que é pior: a farra maior é a dos áulicos do palácio presidencial, que pretendem blindar, deixando a batata quente para os demais apaniguados.
Mas essa coletânea delituosa e imoral é café pequeno diante de uma dispensa de licitação de R$ 450.000,00 por serviços desconhecidos, escondida em uma página discreta do diário oficial de uma Câmara Municipal, entre tantos outros atos que ninguém vai questionar, porque, como disse um especialista, os delitos dos amanuenses nas paróquias não repercutem tanto como a notícia grotesca de que uma tapioca foi paga com cartão oficial a superfaturados R$ 8,30 por um deslumbrado ministro de Estado, um comunista que não tem nada com aquela geração de intrépidos audazes que, por convicção ideológica, levavam uma vida de cão e só comiam o pão que o diabo amassou.
Devolver a grana é o mínimo
Do ponto de vista da ética e dos bons costumes, não há escapadela para os cortesãos deste e dos governos d’antão, de todos os valhacoutos. É devolver o dinheiro usado indevidamente, rasgar os cartões e submeter-se a processo entre os tantos artigos capitulados na fatura de nossos códigos.
Nem a pose de “dama de ferro” da dona Dilma vai conseguir justificar tantas e tão desrespeitosas violações dos deveres elementares dos encastelados nos podres poderes por acidentes de percursos de uma história que, de resto, nunca viu a utopia da austeridade com bons olhos.
Em lugar nenhum, eu lhes assevero; em tempo algum encontrei momentos em que o bem foi hegemônico. Nisso, não tenho constrangimento em dar a mão à palmatória do florentino Maquiavel, cuja crônica é tão atual.
O mais deprimente, é que o avanço sobre o cobre fácil de um erário que cobra de tributos os olhos da cara e mantém sua massa funcional e seus aposentados e pensionistas a pão e água, é que não há exceções: oriundos da nobreza ou da ralé rivalizam-se na insaciável corrida ao butim, como se a temporariedade do acesso ao cofre lhes obrigasse à busca da maior rentabilidade no menor espaço de tempo.
A sensação de que se tem, na leitura dos diários e na audiência dos tele-jornais, é que essa bactéria a todos contaminou. Pelo que li, vi e vivi, há três tipos de sanguessugas: os que estão hoje por cima da carne seca, os que já estiveram e os que tramam para furar a fila e pôr logo a mão no filé mignon.
Estou fora
Não me considero nenhum Savanarola - Deus me livre do fantasma desse controvertido “puritano”. Mas me vejo tomado por uma cólera inconveniente, eis que tudo se entrelaça no cipoal do desvario e, paranóia à parte, redunda no próprio esbulho do meu mandato parlamentar, por uma canhestra cassação liminar, assinada por um desembargador apressado e de malas para recesso do judiciário, sob a égide do sofisma processual, aquela história da carochinha que você conhece: eu teria renunciado ao mandato antes mesmo de empossado e à distância do foro legal.
Até por sacar que sou realmente a inconveniência em pessoa, comunico aos meus leitores que decidi formalizar minha desistiência da pré-candidatura a prefeito no âmbito do meu partido. Tomei a iniciativa meio alquebrado por uma roda viva que me exaspera enquanto homem público e a avaliação de que essa indefinição está gerando mau entendido até entre os correligionários, como se minha pretensão estivesse associada à perda temporária do mandato em circunstâncias tão kafkianas.
O que não quer dizer, enfatize-se, que estou renunciando a coisa alguma. Nem ao mandato conferido pela quarta vez, que hei de resgatar apesar das cartas na mesa, nem às trincheiras de hoje, nem aos possíveis embates do amanhã.
Porque é da guerra sem quartel que tenho sorvido a melhor seiva de minha vida.

domingo, 10 de fevereiro de 2008

A justiça que espero no canto do galo da madrugada



Em 2005, o Teatro na Justiça da Escola de Magistratura do Rio de Janeiro se aventurou a exibir a sua própria interpetação de “O Processo” de Franz Kafka e apresentou sua versão dramatúrgica do clássico, sob direção e adaptação de José Henrique, com a participação especial do ator Tuca Andrada como Jose K.. Mal sabia que aqui mesmo, no nnosso TJ-ERJ eu passaria por coisa parecida, porém, mais inexplicável do ponto de vista do direito.
“Agora sei quem sou.Sou pouco, mas sei muito,porque sei o poder imenso que morava comigo”
Thiago de Mello, poeta e patrimônio cultural da humanidade, nascido no meio do pedaço mais verde do planeta: a Amazônia.

A madrugada passa mais rápido e já não é uma criança, como nos idos da minha infância. Digo e provo, mas não vou perder tempo com isso. O certo é que faz um instante os vários relógios do meu entorno diziam-me duas e cinco. E, no entanto, num lapso, já são quase três.
Não sei se você vai me entender, mas a madrugada também tem o dom de liberar o que Freud chamou de “id”, a parte mais profunda do “psique”, receptáculo dos impulsos instintivos, dominados pelo princípio do prazer pelos desejos impulsivos (obrigado, mestre Aurélio).
Durante anos, encantei-me com as teorias do reflexo condicionado de Ivan Petrovich Pavlov. Calma. Era russo, mas já tinha ganho o Nobel de Medicina em 1904, antes dos perigosos bolchevistas botarem o Kerenski para correr. Portanto, poupe-me de novas suspeitas.
Onde moro, no sopé da serra dos Três Rios (inveja afetuosa do grande jurista Carlos Roberto Siqueira Castro, habitante do lado neurótico da cidade) a natureza ainda fala mais alto. Não é o sítio paradisíaco d’outrora, mas os pássaros que aqui gorjeiam já não gorjeiam por aí (revisitemos Gonçalves Dias, mais do que uma rua estreita no centro da cidade).
Como o silêncio do verde abre suas asas sobre meu pendor artístico, olho longe, nada vejo naquelas ondulações, mas repito o poema vital de Thiago de Mello: faz escuro, mas eu canto.
Permito-me as reminiscências, por ser tão livre como Jean Paul Sartre, para quem “nenhum limite para liberdade pode ser estabelecido, a não ser a própria liberdade”. E o faço na plenitude da minha atávica sede de justiça, essa utopia cada vez mais etérea.
Houve o meu tempo de cárcere, de que nenhum pensador devia prescindir. Graciliano e Jean Genet que o digam. Era quando estava condenado a ler, a transpor as grades pela busca do conhecimento possível dentro da pedra em que um dia também ficou Joaquim José da Silva Xavier.
Os bons e os maus
Aquela relação carnal com cada livro que atravessava o crivo do carcereiro, à vista ou por baixo do pano, me fez o homem que sobrevive às procelas com a dignidade de um Júlio Fuchik, que escreveu seu “Testamento ao pé da Forca” no cárcere nazista onde seria executado, legando-nos a mais rica das heranças:
“Só vos peço uma coisa: se sobreviverdes a esta época, não vos esqueçais nem dos bons, nem dos maus(..) Eles eram pessoas e tinham nomes, rostos, desejos e esperanças, e a dor do último não era menor do que a dor do primeiro, cujo nome há de ficar...”
Foi lá dentro daquela pedra da Ilha das Cobras que descobri o jovem “Conde de Lautréamont”, o inquieto uruguaio que morreu em Paris aos 24 anos e sacudiu as letras com seu canto, no século 19, baseado na idéia-força de que “a arte é a libertação do reprimido”.
Permito-me escalar os píncaros da sabedoria porque hoje me ocorreu lembrar-me do arbítrio primário que doutos magistrados perpetram contra o voto tido e havido como soberano, em nome de um consórcio judicial que tudo pode (muito mais do que os tensos generais d’antão) pois do que fazem em nome da Lei não se permite ir além das quatro linhas, do latim de jargão, sob o risco de um terror que deixaria Robespierre arrepiado, a guilhotina dos “danos morais” que serão julgados pelos próprios pares.
Eu até queria falar tudo, mas como meus amigos advogados, crentes no mito do direito, estão convictos de que tudo não passa de um grande “equívoco” a ser reparado em curto prazo, mantenho-me no limite do limite, até porque o mandato que uma malsinada liminar surrupiou não me pertence, mas aos brasileiros desta urbe nervosa que confiaram na minha palavra pela quarta vez.
Se você não sabe, na véspera do recesso judicial, um desembargador acolheu um mandado de segurança contra ato “monocrático” de uma desembargadora e sobrou para mim: em sede liminar, como se diz na linguagem jurídica, ele entendeu de desautorizá-la e, na mesma cajadada, mandou empossar o suplente no meu lugar, sob a folclórica alegação de que em tempos idos, antes mesmo de disputar o pleito de 2004, eu assinara um termo de “renúncia expressa”, feito peça de delito, embora seja da Lei que um parlamentar só renuncia perante sua Casa legislativa, de posse do mandato.
O que seria matéria da Justiça Eleitoral, que já se havia pronunciado com rotunda clareza em duas oportunidades, escorreu para a Câmara Cível e lá tramita como demonstração de que são poucos os que podem atirar a primeira pedra. Aos advogados, impõem-se prazos fatais: dos magistrados e do ministério público, quem ousa exigir o mesmo?
Para além de Kafka
Podem preservar o suplente no meu lugar pela lenta demora de submeter a medida precária a um colegiado, apesar do tal periculum in more, que não conta no meu caso, e ao contrário do que está escrito no volumoso Código do Processo Civil, no regimento interno do Tribunal de Justiça e demais tratados.
Ironicamente, a mim, profissional das letras e da palavra, é oferecido o privilégio de uma situação tão absurda, que transpassa Kafka,aquele inesquecível do “Processo”, revelando a olho nu uma balança de dois pesos e uma venda transparente, apoiadas em uma nova filosofia: A UNS, A GENEROSIDADE DA LEI, A OUTROS, O SUPLÍCIO DA HERMENÊUTICA, O EXPEDIENTE DO “FUMUS BONI IURI” , ou justiça do fumo, que plasma o aforismo "onde há fumaça há fogo".
Ao contrário dos doutos magistrados, que, no Brasil, ficam lá até os 70 anos, um parlamentar eleito tem dia e hora para encerrar o mandato. E aí é que mora o perigo: o advogado do suplente vai querer evitar o que já aconteceu em primeira instância e, incrivelmente, não foi tomado em conta na segunda: o julgamento do mérito.
Segundo os profissionais do ramo, até os que receberam agora as carteirinhas da OAB, não prospera decisão interlocutória quando já há sentença. Mas nesses dias em que uma amiga e leitora, do outro lado da ponte, se diz saudosa do regime militar (fora os excessos) o que pode e o que não pode no tabuleiro de leis para todos os gostos, quem sabe é o senhor juiz, segundo o velho provérbio: cada cabeça uma sentença.
No momento destas últimas linhas, o sol se insinua por cima da montanha. Ouço um galo cantar, não sei aonde, mas que ele está anunciando o novo dia, ah isso não tenho dúvida. Esse novo dia sempre vem para mostrar quem são os bons e os maus, como desejava Júlio Fuchik. E para fazer a justiça que a Justiça não faz.
coluna@pedroporfirio.com





Se bobear, eu é que vou parar no xilindró

MINHA COLUNA NO JORNAL POVO DO RIO DE 11.02.08 (Página 4)

Ainda bem que você não me cobrou um palpite sobre o assunto do momento, esse festival de jocosas revelações sobre o mau uso do mal inspirado “cartão corporativo”, dinheiro vivo e fácil à mão de não sei quantos cortesãos.
Ainda bem, repito em letreiros luminosos, porque não gosto de hipocrisias, nem de embarcar na nave da vez. Pode ser até o assunto da moda, mas eu lhe pergunto com toda a sinceridade: se dona Matilde não tivesse passado seu cartão no “free shop”, tanta pasmaceira teria vindo à luz?
Há um quê de inexplicável nessa nova cruzada capciosa, que não quer ir fundo, embora, fique claro: eu, que fui titular de uma Secretaria envolvida em emergências – Desenvolvimento Social – e nunca recorri a astúcias, não estou aqui para passar a mão na cabeça de ninguém.
Antes, pelo contrário, acho que essa é a hora de cortar umas certas cabeças que engendraram essa alquimia com a intenção clara de formalizar um “caixa 2” despudorado.
Dizer que houve só mal uso é, mais uma vez, jogar para a platéia. A ser honesta a proposta, não há outra providência senão rasgar todos esses cartões.
E mais: vai fundo e você vai encontrar algum lobista dessa ou daquela “bandeira” por trás da cartola que, antes de ter sido pecado localizado nesse ou naquele ministério, é uma farra da pesada, envolvendo muita gente desde que, no primeiro ano deste milênio, o sábio FHC baixou decreto, burilando a peça, já em uso desde de 1986.
E é bom que se diga: esse ralo não é exclusivo do poder executivo. Tome tenência e gosto pela verdade e você verá estripulias de igual conteúdo nos três sagrados poderes da República e em muitos estados, já que os maus costumes são vírus que se espalham com o sopro da primeira ventania.
Nesse carnaval de pouca vergonha, se gritar “pega cartão”, não escapa um, meu irmão. Vai querer encarar essas trapaças de cabo a rabo, sem poupar quem quer que seja, conte comigo.
Em certas áreas que ninguém ousa meter o bedelho, tem coisas do arco da velha. Porque a corrupção é hoje uma robusta enciclopédia que faz um festão da vida de quem detém qualquer poder, seja aqui, ali ou acolá.
O que eu acho uma covardia é ficar só nisso ou naquilo. Os incautos sempre pagam o pato, até por serem novos no ramo. Pagam, vírgula, daqui a pouco estarão por aí serelepes rindo das nossas caras.
Dentro da minha atual busca voraz da verdade, também estou preparando a “Enciclopédia da Corrupção”, na qual há verbetes para todos os paramentados. Se concluí-la, assim como me surrupiaram o mandato, eu é que vou acabar indo para o xilindró.
coluna@pedroporfirio.com

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Os soldos dos militares e a "realidade do mercado"

MINHA COLUNA NA TRIBUNA DA IMPRENSA DE 8 DE FEVEREIRO DE 2008

"Nós não temos a menor condição de decidir nenhum aumento de pessoal no momento em que eu tenho um desequilíbrio no Orçamento. Eu preciso primeiro resolver os problemas do Orçamento para depois tratar disso"
Paulo Bernardo, ministro do Planejamento.
Volto a insistir: a ninguém de boa fé é lícito embarcar nessa orquestrada desmotivação da atividade profissional dos militares. Mais do que qualquer outro país do nosso Continente, o Brasil precisa garantir-lhes o mínimo de condições de trabalho, porque, independente de qualquer sistema, de qualquer visão ideológica, as Forças Armadas sempre existirão como espinha dorsal da nacionalidade: elas atravessarão os anos e os séculos, indiferentes a eventuais (e inevitáveis) erros e desvios que alguns dos seus comandantes possam ensejar.
Nos dias de hoje, perder de vista o papel decisivo de um contingente militar remunerado dignamente é transformá-lo no maior exemplo das distorções salariais no quadro das atividades de Estado. Deixá-lo sem meios operacionais adequados é abrir um perigoso fosso na segurança nacional e estimular a consolidação do projeto de apropriação mansa e pacífica de nossas riquezas, através de ardilosas manobras, que vão desde a privatização de empresas estratégicas, como a Vale do Rio Doce, até o acintoso franqueamento da nossa Amazônia.
Outro dia, comparei os soldos das Forças Armadas, aos vencimentos dos policiais militares do Distrito Federal. Nessa aritmética, os integrantes das três armas já saem perdendo. A Polícia do DF, paga com recursos da União, é a massa militar melhor remunerada do país. No entanto, a remuneração baixa de um soldado do Exército é também inferior ao da PM alagoana, considerada a que paga os piores vencimentos: R$ 850,00 contra R$ 772,00 do soldado engajado.
Mas se você comparar o soldo de um oficial que passa 30 anos de dedicação exclusiva, sujeito a servir em qualquer parte do país, com um jovem magistrado, vai cair de costas.
Enquanto um oficial no topo da carreira não chega a R$ 14 mil, incluindo todas as vantagens como tempo de serviço e habilitação em cursos especializados, um jovem com três anos de diploma e menos de 30 anos de idade pode ingressar na magistratura com o vencimento inicial de R$ 20.900,00.

Diferenças humilhantes

Sobre as diferenças entre o que ganha a tropa e outros segmentos do Serviço Público, o general-de-divisão reformado Synésio Scofano Fernandes fez um meticuloso estudo comparativo, que, por si só, é um ingrediente explosivo na medida em que demonstra com números oficiais estarem os militares em piores condições remuneratórias, perdendo, inclusive, para a média dos servidores civis do Executivo, que padecem de um arrocho salarial impiedoso.
Seu relato, baseado no Boletim Estatístico de Pessoal do Governo Federal, mostra que a média de vencimentos totais entre militares é de R$ 3.047,00 (excluindo desse cálculo os recrutas, considerados efetivos variáveis, que ganham uma miséria).
Na sua comparação, esse vencimento médio perde de longe para o Ministério Público Federal, cuja média é 355,45% superior, para o Judiciário (306,95%), Banco Central (265.50%), Legislativo (256,15%), empresas públicas (120,31%) e servidores civis da administração direta (29,85%).
Difundido e reproduzido em dezenas de sites de acesso dos militares, esse documento faz comparações apenas no âmbito do Serviço Público Federal. Ele não considera remunerações fora da área do funcionalismo, como se só fosse possível apontar injustiças e incongruências entre os que recebem diretamente do erário. Como se a remuneração da área privada fosse dinheiro que caísse do céu.
Os militares nunca atentaram para os super-salários dos executivos das grandes multinacionais, inclusive das privatizadas e as concessionárias dos serviços públicos. Mas os números indicam uma distância humilhante entre o que é pago a um executivo, em média com 40 anos de idade, e um general de 4 estrelas, com mais de 30 anos de tropa. A existência desse mercado em ascensão tem levado muitos oficiais a abandonarem a farda e colocarem seus conhecimentos adquiridos nas escolas militares a serviço dessas empresas, muitas, como a Vale do Rio Doce, dedicadas a atividades sobre a exploração de áreas estratégicas.

“Pessoas jurídicas”

O “boom” dos salários dos executivos aconteceu após a farra das privatizações. Em maio de 2002, a revista VEJA publicou:
“A Perfil Consultores concluiu um estudo sobre a remuneração dos superexecutivos brasileiros. Foram pesquisados os salários nas empresas com faturamento anual acima de 1,5 bilhão de dólares. O trabalho mostra que os executivos conseguiram aumento no ano passado quase duas vezes maior que a inflação. Uma curiosidade: o mais bem pago do país levou para casa 3,3 milhões de reais em 2001”.
Toda essa elite econômica costuma mascarar-se de “pessoa jurídica” individual para passar a perna no Imposto de Renda, o que nenhum militar ou funcionário público pode fazer. Daí a valorização recente dos contadores e profissionais da área financeira, que passaram a ser incluídos nas cúpulas das grandes empresas.
Segundo o professor Fábio Konder Comparato, da USP, “Mais da metade do PIB brasileiro não é contabilizada. São trilhões de reais sonegados por grandes empresas e corporações. Com um poder aquisitivo desses compra-se tudo, até a impunidade”.
Mas a cabeça manipulada do cidadão comum, seja civil ou militar, não tem a menor idéia da concentração de renda, que faz com que 130 mil pessoas detenham metade do Produto Interno Bruto no Brasil, algo em torno de 1 trilhão de reais, segundo revelou o The Boston Consulting Group (BCG), no início de 2008, com números da Receita Federal.
Na análise comparativa dos soldos dos militares, não se pode omitir o quadro salarial como um todo. Um estudo do IPEA divulgado em outubro de 2007 conclui que a diferença entre o menor e o maior salário no Brasil é de 1.714 vezes, isso considerando a premissa de que o maior salário é de um Executivo da Região Sudeste, que ganha R$ 120.000,00 e o menor, o de um trabalhador do setor de serviços da mesma região, que receberia por mês bem menos do que o salário mínimo, isto é, não mais de R$ 70,00.
No setor público, a pesquisa oficial é também falha, pois trata tão somente dos vencimentos dos estatutários da administração direta, para encontrar R$ 28 mil como a maior remuneração, esquecendo de anotar os penduricalhos no Judiciário e no Legislativo, que podem dobrar esse valor, e os salários em estatais, fundações e no sistema “S”, mantido pelo desconto na folha salarial dos trabalhadores.

Em tempo: dediquei todo o carnaval às pesquisas sobre a questão dos militares, preparando um trabalho com a minha visão e as minhas informações sobre todo o processo histórico que levou à situação atual. Ainda não acabei o texto, que já soma quase 47 mil caracteres, isto é, o equivalente a quase oito colunas na TRIBUNA. Tão logo conclua e ponha no blog, farei uma correspondência informando.
Pedro Porfírio

HORA DE CAIR NA REAL

Coluna no jornal POVO DO RIO de 8 de fevereiro de 2008
Agora que o carnaval passou, é de se perguntar quando é que o nosso povo vai cair na real. Isso mesmo: cair na real. Porque em matéria de fantasias, descontração e vocação festiva ninguém chega perto dos brasileiros.
Desculpe, não quero ser o estraga prazer. Mas, meu Deus, já pensou se aparece um maluco com a idéia de promover um carnaval a cada três meses? Esse lunático teria até como argumentar: afinal, esse corpo que dança e está à mostra, dos pés a cabeça, como nos tempos áureos de Adão e Eva, é um forte apelo turístico.
E não há uma indústria mais sintonizada com a natureza do brasileiro, especialmente dos moradores desta cidade que nessas horas parece maravilhosa.
Eu passei esses dias todos enfurnado numa pesquisa sobre salários dos militares e dos civis, esse drama todo que não é suficiente para conter 500 mil pessoas na Avenida Rio Branco, atrás do Cordão do Bola Preta, em plena manhã de sábado.
Estou realmente invocado com a concentração da grana na mão de uma ínfima minoria. Mas chegou a pensar que sou um “ET”. Pelo som dos tamborins e as latas de cerveja espalhadas nas calçadas, fico a imaginar que ando com a idéia do personagem do “Alienista”, a obra genial de Machado de Assis.
Você já parou para pensar? Então fica com essas informações: Um estudo do IPEA , órgão do governo federal, divulgado em outubro de 2007 conclui que a diferença entre o menor e o maior salário no Brasil é de 1.714 vezes, isso considerando a premissa de que o maior salário é de um Executivo da Região Sudeste, que ganha R$ 120.000,00 e o menor, o de um trabalhador do setor de serviços da mesma região, que receberia por mês bem menos do que o salário mínimo, isto é, não mais de R$ 70,00.
No setor público, a pesquisa oficial é também falha, pois trata tão somente dos vencimentos dos estatutários da administração direta, para encontrar R$ 28 mil como a maior remuneração, esquecendo de anotar os penduricalhos no Judiciário e no Legislativo, que podem dobrar esse valor, e os salários em estatais, fundações e no sistema “S”, mantido pelo desconto na folha salarial dos trabalhadores.
Um outro relatório, divulgado no início deste ano pelo The Boston Consulting Group (BCG), com base em números da Receita Federal, revela que 130 mil pessoas têm metade do nosso Produto Interno Bruto (a soma de nossas riquezas) , algo em torno de 1 trilhão de reais.
Eu me toco com isso. Muitos que não sabem nem onde cair morro estão mais ligados na modelo que perdeu o tapa-sexo e no sarro que pode tirar no Bola Preta ou nos encantos da Beija Flor.
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